Procurando... (Cap 21)
O sol pra mim era apenas uma mancha branca e incandescente que turvava minha visão. Eu não sentia mais meus pés que afundavam na areia à cada passo. Tudo ainda era muito confuso e meu corpo doía miseravelmente! Eu não lembrava de já ter sentido tanto calor e sede na minha vida. A cada passo um latejar na região lombar me lembrava que algo estava errado, muito errado.
Minha boca estava cheia de areia e minha língua grudava no céu da boca em uma sede insuportável! Eu não sabia ao certo onde estava ou porquê. Não lembrava de ter chegado alí. Me fez lembrar das drogas do hospital grande e medonho da Fortaleza.
Alguém me puxava de tempos em tempos e me ajudava a andar quando eu achava que iria cair.
Ao cair da noite, um vento frio cortante começou a varrer as areias e me açoitar sem só. Tremendo de frio e exausta, minha mente começou a clarear.
-Meu Deus, como vim parar aqui? O que está acontecendo? -Senti o pânico crescer dentro de mim.
A curiosidade e o medo me ajudaram a perceber o lugar, algumas ruínas no meio do deserto, mais a frente uma montanha que as escondia estrategicamente. Meu bebê deu um pulo dentro de mim protestando. Meu precioso bebê, onde estava Niga? Eu sentia a sua falta e tinha certeza que ele viria me buscar. Eu nem percebi que estava chorando, só quando as lágrimas salgadas molharam meus lábios foi que percebi então. A minha cabeça doía e girava, tudo escurecia na minha visão de tempos em tempos. Insolação! Gritava uma vozinha lá no fundo dentro de mim, fiquei alí, meia dormindo, meia morta de fome e fraca demais para levantar!
Procurei por alguém rolando os olhos nas órbitas e só vi um homem alguns passos atrás de mim e me olhava de um jeito que me dava calafrios. Quem quer que fosse que me trouxe alí me deixou sozinha e nem precisava me amarrar, pra onde eu iria? Grávida, exausta e provavelmente com insolação? Eu provavelmente desmaiaria nos primeiros passos. A mudança brusca de temperatura, típica do deserto, acabou com as poucas forças que me restavam... Escorreguei no chão arenoso e tudo ficou escuro.
Umas pontadas nas costas, mais outra e mais outras... Me lembravam a dor de um chute bem nessa região, uma lembrança de tempos mais felizes quando eu e meu marido éramos apenas dois adolescentes aprendendo a jogar bola. Não! não esse marido, o anterior morto! A dor voltou tão rápido que me deu náuseas, a dor continua e excruciante, eu sabia agora, tinha certeza! O parto!
Abri os olhos e notei uma espécie de tenda, eu tinha sido lavada e trocaram minhas roupas também!
Sentei na cama baixa e improvisada, alguns homens me olhavam torto, mas nenhum alien! Onde quer que eu estivesse e porquê, estava apenas com humanos e isso não era bom.
A algum tempo atrás eu acharia que era um sonho realizado ser sequestrada no meio da noite de dentro da fortaleza e levada para o meio dos meus. Mas agora o que quer que estivessem fazendo colocava todos eles em tamanho perigo que eu não gostaria nem de imaginar!
Estava tão claro e tão quente que meus cabelos colavam ao meu redor, a camisola grande e branca se enrolava no meu corpo me deixando sufocada. Outra dor que perdi o fôlego, me lembrou que era cedo demais, faltava ainda uns dois meses para o parto, estava tudo errado!
A cada contração eu gritava e sentia meu bebê totalmente agitado dentro de mim, quando a dor deu uma trégua eu olhei minha barriga, acariciando e tentando acalmar o pequeno lá dentro. Comecei a cantar cantigas bobas que meu pai cantava para mim até muito tempo depois de estar crescida, canções que me acalmavam quando estava triste;
-O que há de errado com você abóbora?
Será que seu sabor azedou?
Ou será que seu amado coelho não gostou?
Ou suas pequenas ramas se enrolou?
Seja como for,
tenha certeza que ele te amou!
Pela sua cor viva.
Se apaixonou!
Duas luzes azuis como neon, brilharam no teto e no chão da cabana, me assustando, eu ri quando percebi que seus olhinhos se abriram e fecharam dentro de mim, tudo valia a pena por esse ser tão inocente. Eu lutaria até a morte por ele.
Nesse momento alguém parou na abertura da cabana, me cegando por instantes, quando meus olhos se ajustaram eu pude vê-lo. Lindo e magro exatamente como no hospital, os olhos de Daniel eram febris, como se alucinasse com algo, como se não me reconhecesse realmente. Me deu um calafrio na espinha, me deu um medo terrível!
-Dan, o que estamos fazendo aqui?- Fiquei em pé com dificuldade-
Ele me olhava como se não entendesse minha pergunta, a cicatriz repuxou sua boca bonita quando ele sorriu com sarcasmo.
-Salvei você, está livre dele agora abóbora!- Ele gargalhou tão alto que eu assustei, caí sentada de novo na cama.
-Mas o bebê vai nascer...- Eu comecei a entrar em pânico- Isso não tem graça, me leva de volta, preciso do hospital!- Ele riu e depois cerrou as sobrancelhas.
- Você tem tudo o que precisa aqui, e depois, trocaremos o bebê pelo nosso planeta, será que ele vai querer? Não sei, talvez não sobreviva por ser prematuro...-Ele falava pra ele mesmo, perdido em pensamentos... Saiu da cabana e me deixou alí, apavorada com tudo que estava por vir.
Quem quer que fosse esse homem antes ele não existia mais, Daniel estava tentando algo que não conseguiria, e que mataria mais dos seus semelhantes no processo. Niga e nenhum dos seus seriam ameaçados e o mais importante, jamais deixariam seu novo lar por uma ameaça que eles poderiam tão facilmente reprimir.
Uma dor mais forte tomou meu corpo e eu gritei a plenos pulmões, sentindo a bolsa se romper tão precocemente e molhar a cama.
Longe dali...
O meu corpo estava tenso, meu coração disparado e meus olhos a todo momento vêem as luzes fugirem à meu controle. Tudo ficou azul no meio da escuridão do deserto. Pisquei bem firme e respirei profundamente algumas vezes para recuperar o controle.
Eu tinha os cabelos soltos e bagunçados, estava descalço e com apenas a calça do uniforme branco, e nem sentia o frio da noite, estava desesperado por notícias de Susan.
Eu suava e sentia o suor descer a linha da coluna, passei a mão nas costas tentando secar com rispidez. Não era alguém que inspirasse outros homens a me seguir cegamente como antes, eles me olhavam aflitos e descrentes.
-É a mesma duna de areia, -expliquei aos meus homens- Já passamos por aqui, vejam, ainda tem umas marcas de pneu alí na frente.-Expliquei.
Meus homens me olhavam com rostos estranhos e sem entender direito o porquê. Eu podia entendê-los é claro! O que eu fazia procurando no deserto uma fêmea de raça tão inferior? Logo eu. um comandante tão respeitado? Era óbvio que nenhum de nós que pisou nesse planeta era o mesmo, todos tinham mudado de formas diferentes e irreversíveis,
Muitos ainda não entendia meu casamento, outros achavam desnecessário perder tempo com seres tão inferiores, deveriam apenas serem esmagados, eu poderia casar com qualquer outra humana, e etc.
Mas o que eles não entendiam ainda era que nenhuma delas, humanas ou não, haviam tocado meu coração, não desse jeito, não dessa forma... Alguns nunca entenderiam...
Senti lágrimas correrem contra minha vontade por meu rosto, eu precisava encontrá-la logo, meu filho e Susan precisavam de mim, eu podia sentir, assim como eu também precisava deles para continuar vivendo.
-Vamos mudar de rota, vamos pegar o destino dos mercadores, é a rota mais difícil e a mais provável que tenham seguido.
Todos assentiram como eu sabia que fariam, entraram nos carros sem questionar, mas eu podia ver as perguntas em seus olhos brilhantes! Estava lá, bem no fundo, a mesma pergunta que eu mesmo me fiz durante todo o trajeto de busca: -Quem permitiu que prisioneiros escapassem com uma pessoa tão vigiada e preciosa como Susan? O que quer que estivesse acontecendo acabaria em sangue dos dois lados.
Senti o nó da minha garganta quase me sufocar, segurei o choro como pude durante toda a noite. Ao amanhecer avistamos um cruzamento e as chances de encontrá-los reduzia a cada hora perdida. o comboio avistou um cruzamento e descemos dos veículos para averiguar.
Tinha muitas marcas no chão, alí o solo mais duro, quase próximo às montanhas, confundiam e não davam nenhuma pista de identificar quais marcas eram dos captores de susan.
O desespero fez desmoronar meu auto-controle, primeiro as luzes me cegaram e então gritei, um grito desesperado caindo no chão. Meus homens olhavam quase tão assustados quanto eu. Quando perdi a voz o nó na garganta continuava mais sufocante do que nunca, uma fúria cega tomou conta de mim.
-Eu vou arrancar sua cabeça, eu vou arrancar sua cabeçaaaaaa... -Meus homens olhavam apavorados, nunca me viram tão descontrolado.
-Não haverá lugar no universo onde eu não procure Daniel, eu vou arrancá-lo de seu esconderijo e vou arrancar sua cabeça...
Continua...