Sejam bem vindos ao meu blog!

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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

(Cap 14) Primeiro sorrimos!

Os dias eram estranhos agora, eu ainda tinha medo, tinha que admitir! Mas minhas noites são tranquilas, o sono reparador. Meus cabelos vermelhos brilham mais e minha pele tem mais viço. Eu não sei o que acontecerá agora, não sei quando será a noite  núpcial, mas já não tenho tanto medo.
Sei que isso acontecerá de um jeito ou de outro, mas tenho certeza agora que Niga pelo menos será gentil, não vai me devorar ou me matar.
Toda manhã passeamos juntos pelos corredores, ele me busca após o desjejum, andamos pelos corredores, voltamos e nos despedimos. Nem sempre conversamos, somos o tipo de pessoas que ficam bem com o silêncio.
No terceiro dia de caminhada resolvi perguntar o que estava me consumindo.
-E então, quando será finalizado o casamento? Concluído, quero dizer.-Ele me olhou imediatamente observando atentamente meu rosto.
-Dentro de alguns dias, na verdade acho que na próxima semana.-Ele pegou minhas mãos e as levou próximas ao seu lindo nariz e inalou profundamente.
-Po-por que está cheireando minhas mãos? -Perguntei constrangida.
-Tem um cheiro suave que é só seu, impossível de destinguir.- Ele disse soltando minhas mãos de repente.
-Mas é imperceptível aos humanos, que inutilidade ter te contado!- Ficou constrangido e virou o rosto.
-Tudo bem, acho bom saber mais sobre você, seu povo. Somos tão iguais e mesmo tempo tão diferentes...
Ficamos ambos constrangidos.
-Pelo menos me diga com que se parece esse cheiro. -Ele virou o rosto.
-Não sei ao certo.
-Tente, por favor! -Ele continuava de costas olhando, da porta do nosso quarto, o longo corredor.
-Não conheço muitos cheiros daqui, é tudo muito novo pra mim. A atmosfera diferente fez com que muitos cheiros sejam agradáveis, outros comuns à vocês, sejam insuportáveis pra mim.-Um meio sorriso passou por seu rosto.
-Entendo-Disse a primeira coisa que me veio a cabeça.
-É um cheiro bom, não se preocupe. -Ele se virou e me encarou com aqueles olhos sombrios. As chamas estavam lá é claro! Mas menores, como se ele tentasse se conter.
Eu automaticamente saltei pra trás, o instinto de sobrevivência gritando dentro de mim.
Ele se aproximou lentamente, pegou meu rosto entre suas mãos e sussurrou de encontro a minha fronte. Primeiro palavras indecifráveis de sua língua natal e depois palavras em português, mas tão baixo que eu não conseguia ouvir, como se dissesse pra ele mesmo.
Sem soltar meu rosto ele me olhava fixamente e então falou baixinho.
-Nunca tenha medo de mim, minha fúria, muitas vezes, é dirigida a mim mesmo, entende?
Eu balancei a cabeça afimativamente. As chamas azuis dançavam dentro de suas iris.
-Claro, também é tudo muito novo pra você. -Ele constatou me soltando finalmente. As chamas desapareceram do mesmo jeito que surgiram, rapidamente.


Depois desse dia os passeios ficaram mais curtos. Niga me olhava de um jeito diferente do estranho habitual. Do nada as chamas apareciam, ele me encarava por alguns segundos, piscava e elas sumiam. No quinto dia eu soube que o último ritual aconteceria no dia seguinte. Algo a ver com o luar. Nada mais que isso. Nem uma palavra, por mais que eu tenha interrogado cada um daqueles que me atendem diariamente.
Deitei ansiosa demais e não consegui dormir, quando o sol aparecia no horizonte que eu consegui descansar um pouco. Aquele estado físico que fica entre o sono e a vigília.
A cabeça doía miseravelmente.
As portas foram abertas com um barulho que me fez saltar de susto. Um batalhão de mulheres entrou e já foram me arrastando banheiro adentro.
Uma massageava meu couro cabeludo enquanto outra me sentava em uma banqueta de frente ao enorme espelho trazido por elas.
Fui lavada, escovada, minhas pernas e axilas depiladas. Fui bezuntada com óleos e obrigada a deitar com uma substância verde e cheirosa emplastrando meu rosto.
Fosse qual fosse a máscara facial, me relaxou tanto, o cheiro suave acalmou a dor de cabeça que então adormeci.


Quando acordei minhas costas estavam doloridas por eu não ter mudado de posição, a noite havia chegado. Eu tinha dormido umas oito horas. Estava descansada apesar de tudo, me sentia leve.
Até me lembrar da noite que viria.
Senti uma onda de pânico surgir no meu estômago e revirá-lo.
Foi trazida uma bandeija com frutas, tomate, leite e um pão pequeno recheado com carne. O pão foi logo devorado com tomatinhos. Eu queria desesperadamente um chocolate. Minha boca salivava de lembrar da iguaria.
Eu sabia que o desejo por açúcar era só minha ansiedade falando.


Logo em seguida fui lavada novamente e um vestido vermelho foi enfiado pela minha cabeça. Quando me olhei no espelho minhas bochechas ardiam. Era um vestido feito para seduzir. Ele tinha um decote profundo, a cintura tinha escamas sobrepostas de um material resistente que apertava e afinava minha cintura. A saia moldava meus quadris e descia até os pés.
Até as joias tinham essa intenção. Um rubi em forma de gota descansava no meu decote pendurado por uma corrente finíssima e furta cor de um mineral que não era desse mundo. Os brincos eram peças idênticas que balançavam nas minhas orelhas.
Meus cabelos foram trançados com fios brancos entremeados. Nos pés as sandálias eram brancas e de muito bom gosto. Quando fui levada até o carro eu procurei atentamente por meu noivo e não o vi em lugar algum.

Depois de rodar duas horas pelo deserto os carros do comboio parou finalmente. Dunas de areia eram vistas em todas as direções, o vento da noite castigava meu rosto e braços desnudos.
Fui levada por dois deles até uma pequena luz que tremeluzia com o vento.
Meus pés estavm cheios de areia quando chegamos ao que parecia, à uma tenda montada no meio do nada.
A tenda tinha um tamanho razoável. Observei atentamente os detalhes dela. Era espaçosa e um cheiro delicioso começou a vir dentro com o vento.
Meu noivo surgiu na porta de pano e eu fiquei estática quando me dei conta que hoje seria a noite de núpcias!
É claro!

A única coisa que faltava, depois de uma infinidade de eventos, jantares e cerimônias, era a "noite" em si.
Meu noivo me olhava do mesmo jeito que ele tinha me olhado nos últimos dias, do jeito que só agora eu entendia. 
Ele me olhava com um desejo mal contido no olhar, as chamas brincavam em seus olhos, sumindo e aparecendo, como se ele tentasse contẽ-las, do mesmo jeito que ele tentava esconder seu desejo por mim.
Ele vestia branco, uma espécie de terno lindo e elegante. Seus cabelos também trançados nos mesmos padrões que os meus, mas com fios vermelhos.
Ficamos nos olhando até que constrangidos baixamos o olhar.
Ele dispensou meus guardiões com um aceno de cabeça e me conduziu pra dentro da tenda.

Lá dentro o calor do aqueçedor foi bem vindo, suspirei alto esfregando os braços.
Ele me olhou preocupado.
-Elas deveriam ter te colocado mais...-Apontou para o vestido que eu usava. -Mais... você me entende! No deserto pode fazer muito frio a noite. 
Ele se dirigiu a mesa posta com comidas que exalavam um cheiro delicioso.
A tenda continha uma cama imensa com muitos travesseiros e cobertores, tudo branco, a mesa com duas cadeiras e um tapete felpudo no centro, de frente pro aqueçedor.
Eu ainda tremia, não de frio, mas de medo da estréia!
Eu tremia tanto que ele me olhou, largou o prato que servia e veio rápido e começou a esfregar meus braços pra me aquecer.

-E-eu n-não estou c-com fri-frio! Eu disse gaguejando.
Ele parou e me olhou calmamente.
-Eu sei.- Se afastou e continuou a servir seu prato, sentou na mesa e começou a comer.
Eu fiquei parada no centro da tenda olhando-o.
-Sente-se antes que caia, perto do calor. -Ele apontou para o aqueçedor.
Eu estava tão tensa que tinha certeza que se eu sentasse eu quebraria ao meio. Eu me sentia como uma corda de violino repuxada.

Fiquei sentada no tapete por alguns minutos enquanto ele terminava de comer -Eu não te ofereci porque fui informado que você já comeu. -Ele me olhava apoiado na borda da mesa.
Eu não conseguia relaxar com a conversa fiada.
-Podemos...deveríamos...
Ele sentou ao meu lado e virou o rosto para mim, tão perto que eu podia sentir seu hálito de morango recém mastigado, no meu rosto.
-Não importa o que nos mandaram fazer, teremos nosso próprio momento, quando e onde quisermos, nos acostumaremos com a presença um do outro na mesma cama e só então... -Ele me disse com uma calma e certeza que fui relaxando aos poucos.
-Mas primeiro sorrimos! -Ele disse alto e se levantou, abriu uma bandeija pequena e tirou algo pequeno de dentro que sumiu escondido dentro de sua enorme mão.
Ele sorria quando abriu a mão na minha direção.
Eu não podia acreditar! Uma mini barra de chocolate surgiu ali. Eu a peguei e desembrulhei dando uma mordida em seguida.
Ele me olhava divertido.
-Obrigada. -Eu agradeci o presente.
Ele me olhava e então riu alto, uma gargalhada tão gostosa que ri junto até escorrer lágrimas e a barriga doer.
Olhei para meu marido tão relaxada qua agradeci mentalmente toda a distração.
-Primeiro sorrimos! -Repeti suas palavras.
E então ele sorriu novamente.

Continua...

Assistam meu vídeo novo e Feliz Natal!

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

(Cap 13) Recomeçar

Meu coração martelava nos meus ouvidos, quanto mais adiavam as "núpcias", mais meu pânico aumentava.
Depois do mergulho, fomos separados de quarto e enquanto não terminar os rituais do casamento não dormiremos juntos.
Niga foi pra uma espécie de despedida de solteiro no deserto. Mas tudo muito radical, nada de mulheres! Consistia em caçar cobras no deserto, eca! Existe gosto pra tudo nesse mundo! Os melhores amigos dele foram, uma tropa de vinte ou mais, voltariam no final da noite.
Eu daria qualquer coisa pra me distrair, pensar em outra coisa.

Eu aprendia cada vez mais sobre eles, sua rica cultura e língua. As aulas começavam logo depois do café da manhã e se estendiam até a noite. A noite eu estava cansada demais pra pensar em qualquer coisa, e não tínhamos ficado à sós pra conversarmos sobre o jantar, péssimo jeito de começar um casamento! As frases que aprendi primeiro foram: Eu amo você, Hai tee co mone! Estou com fome: Ledi che camú, as outras já esqueci.

No segundo dia após o mergulho, nos encontramos nos preparativos do segundo ritual de casamento, esse consistia em comer e beber no mesmo prato e copo as comidas especiais pra ocasião. Eles levam muito a sério a coisa de "se tornar apenas um", só de sentir o cheiro já me fez enjoar, o que quer que fosse cheirava como fígado e eu odiava fígado.
Todos bem vestidos e também comiam no amplo salão oval, o mesmo onde me informaram que eu me casaria para selar a paz. Todos nos sentamos e então todos conversavam e olhavam pra nós sentados no meio do salão. Era como estar num restaurante, todos pareciam se divertir.
Niga chegou e vestia preto dessa vez, os cabelos trançados lindamente no estilo viking, a cor do meu vestido tambem era preto, já os convidados vestiam branco. Nós dois eramos dois pontos negros na imensidão de branco. Eu ficava imaginando que, quem quer que fosse que escolhesse os trajes, devia se divertir com o contraste de cores.

Niga se sentou e eu também, um ao lado do outro. O prato era enorme e a taça também, o material transparente e  furta-cor do prato e taça não era desse mundo, parecia que tinha uma galáxia dentro deles. Ele me olhava do mesmo jeito estranho de sempre, não teve nem um cumprimento, nada.
Ele se levantou e abriu as travessas dispostas na mesa e me oferecia com uma falsa cortesia. Me irritou só até eu perceber que ele sorria com o canto dos lábios, parecia querer aliviar a tensão. Eu me quebraria ao meio se ficasse mais tensa.
Eu agradeci e deixei que ele escolhesse o que comeríamos.
Todos os presentes, humanos ou não, nós observavam atentamente.
Ele fatiou uma ave e colocou no imenso prato, sentou-se com a cadeira levemente na diagonal, para comermos quase de frente um para o outro.

Eu olhei pro prato e fiquei feliz com a ave e tomates dispostos no prato, nada vivo e nenhum cheiro desagradável. Ele fatiou a carne e me olhava atentamente, colocou a carne na boca, mastigou e engoliu. Espetou a carne e me ofereceu na boca fazendo aviãozinho. Eu fiquei parada olhando indignada pra mão dele suspensa no ar.
-Por favor? -Desse jeito eles vão pensar que você me odeia e a toda minha gente! -O sarcasmo implícito na voz serena.
-Eu posso comer sozinha!- Retruquei calmamente para não fazer cena.
-É apenas galinha, todos estão olhando, abra a boca, por favor?
Abri a boca e peguei o pedaço de galinha e mastiguei silenciosamente e engoli. Niga me olhava o tempo todo e eu não conseguia raciocinar. Era um pedaço atrás do outro e eu quase não tinha tempo de respirar.
-Algo para beber por favor? -Pedi segurando seu pulso antes de ele me enfiar mais galinha goela a dentro.
-Claro!- Ele pegou a garrafa reluzente e despejou o líquido transparente dentro da taça enorme. Trouxe até minhas mãos e colocou minhas mãos na base da taça e me ajudou a erguer até meus lábios.
Quando bebi a bebida deliciosa me engasguei, tossi e recuperei a compostura antes de beber mais. Niga me olhava divertido e parecia prestes à me acudir e eu o acalmei segurando na sua mão enquanto tossia, para que ele não levantasse e fizesse qualquer coisa que estivesse em mente, como me chacoalhar ou sei lá...

Quando meu fôlego voltou ao normal, eu tinha lágrimas nos olhos e meu rosto ardia de vergonha. Soltei a mão dele quando notei que eu ainda apertava fortemente seus dedos. Ele pareceu nem notar, a sua mão esquerda continuou estendida em minha direção.
-Beba mais um pouco para acalmar sua garganta.-Ele ofereceu.
-Daqui a pouco eu bebo, vou esperar todos que estão me olhando, cuidarem de suas vidas! -Ri sem graça. Eu era péssima fazendo piadas.
-Nós sempre seremos motivos de especulação, afinal somos nós que mantemos todos unidos. -Ele me disse e sorriu sem graça, parecia que era a primeira vez que conversávamos.
E de fato era a primeira vez que eu não estava com o cérebro corrompido com remédios e drogas e ele também parecia sóbrio.
Eu não queria quebrar a camaradagem e procurei por alguma coisa na minha mente para conversar.
-Como foi? Pegou muitas cobras?- Ele parou no meio da mastigada e me olhou sem entender, depois sorriu e engoliu.
-Sim, algumas. -Bebeu da taça, deixando-a quase pela metade. A bebida era deliciosa e tinha gosto de limão, parecia um champagne.
Eu continuei a encará-lo, eu queria saber mais.
Ele me olhou e mordeu um tomatinho, suco escorreu pelo seu queixo perfeito.
-Aqui, pegue. -Ofereci o guardanapo. Ele pegou e limpou o queixo olhando fixamente para mim.
-O que sua mente curiosa quer saber? -Ele perguntou divertido.
-Tudo...tudo que quiser me contar. -Falei pegando uma nectarina e mordendo.
-Fomos ao deserto com esses carros da areia, quando chegamos um dos carros ficou preso na areia e começou a afundar, Midal ficou apavorado quando afundava e nós não conseguíamos ajudá-lo porque era muito engraçado, se ele parasse de gritar ele veria que ele poderia sair de lá andando!-Ele gargalhou lembrando e a risada era tão contagiante que ri também.

Olhei em volta e só então notei que muitos já tinham deixado o salão, pareciam satisfeitos com o que quer que estavam vendo. Fiquei feliz em saber que podíamos conversar a pesar de tudo. Não tocamos no assunto do jantar e eu fiquei satisfeita por não provocar sua ira. Ele parecia um garoto, relaxado, comendo e bebendo.
Eu não queria estragar o clima, já que tinhamos uma vida toda pela frente poderíamos tentar pelo menos.

Quando estávamos sozinhos no imenso salão ele se levantou e me ergueu pela mão também.
-Está satisfeita? Ele me olhava nos olhos com o olhar divertido como esteve durante todo o jantar.
-Si-sim. Gaguejei.
-Ótimo! Vamos? ele me olhava esperançoso, como se temesse que eu recusasse.
-Sim, pra onde? Ele me puxou pela mão e corria sem parar, parou em frente uma sala trancada e eu já estava totalmente sem fôlego e pelo jeito que subimos sem parar, tinha quase certeza que estávamos no telhado.
-Onde estamos? Perguntei enquanto ele destrancava a porta e entrava, entrei em seguida.
-No meu lugar preferido nesse mundo. -Ele me disse e seu semblante ficou triste.
-Você quer me mostrar? -Eu perguntei e seu rosto se iluminou novamente.
-Sim, vou te mostrar. -Ele apagou a luz e a parede se moveu e a vista era impressionante, de tirar o fôlego.
Dalí era possível ver a fortaleza toda abaixo de nós, e no horizonte a cidade pequenininha.
-Nossa! -Eu disse olhando pelo vidro todo o palácio abaixo de nós.
-Sim, nossa! -Ele riu sem graça.- Eu venho aqui quando quero ficar sozinho, quando tenho saudades de casa.
O telhado se moveu e um imenso telescópio apareceu apontando para o céu azul.

-Venha ver meu lar. -Ele me chamou sentando na poltrona de observação.
Eu andei até ele e ele me sentou em seu colo.
-Olhe entre a constelação de Órion. -Ele me segurava na cintura, seu corpo era deliciosamente quente, contrastando com minha pele fria da noite.
Eu busquei a constelação que ele me disse e esperei que focasse. Assustei quando vi a estrela meio apagada perdida entre as outras estrelas. Eu a reconheci do objeto estranho do quarto de Niga, aquele que projetou a imagem na parede.
Levantei de seu colo e fiquei olhando pra ele. Seu olhar estava tão triste que meu coração doeu por ele.
-Daria tudo pra voltar pra lá, mas é impossível! Tudo que vivia lá agora está morto, conforme a estrela se apaga, o planeta morre lentamente. E então uma lágrima escorreu teimosa em sua linda face.
Ele continuou sentado sem me olhar.

-Esse é seu lar agora, você está em casa. -Eu me impressionei com a verdade daquelas palavras. Tudo que eu queria era viver em paz com ele e com os outros de sua espécie.
Eu já tinha perdoado ele a muito tempo, só agora conseguia perceber isso. Talvez era por isso que eu não me sentia bem perto dele, eu gostaria que ele soubesse. No fundo sempre quis que ele soubesse disso.
Pensei em tudo que me aconteceu e então me dei conta que tudo, a guerra, as mortes, era consequência dos erros humanos.
E até minhas perdas tinham a ver com erros estupidamente humanos.
Não podia culpá-lo eternamente por minhas frustrações.
-Ele me olhou com lágrimas nos lindos olhos e então me puxou e me abraçou, assim sentado e eu em pé.
Chorou e soloçou por longos minutos. Eu chorava baixinho também abraçando e afagando sua cabeça.
Quando ele abriu os olhos as chamas estavam lá, ameaçadoras. Mas pela primeira vez não tive medo. Era apenas alguém que também sofria, como eu.

Choramos por tudo, até a cabeça doer. Quando nos acalmamos ele olhou para o chão constrangido.
Se afastou um pouco e saiu do me abraço. Eu sentei no seu lugar ainda quente e fiquei esperando que ele me dissesse algo.
Ele se virou pra mim, seus olhos azuis vermelhos e um canto da boca estava erguido num meio sorriso.
-Arrunei seu vestido- Ele me disse apontando para meu colo encharcado.
-Tudo bem, seu penteado já era também. -Apontei para seu cabelo desarrumado e sorri.
Rimos feito bobos.
Ele se aproximou e pegou em minhas mãos.
-Me perdoe por tudo, pra começar por sequestrar você... -Eu coloquei a mão nos seus lábios calando-o.
-Está perdoado pelo sequestro, as outras coisas você não é culpado.
Ele sorriu.
-Começamos errado, minha raça e a sua.- Quando disse isso um imenso alívio tomou conta de mim, era a pura verdade.
-Não podemos apagar a guerra e nem a rixa entre nosso povo... -Foi a vez dele me calar.
-Mas podemos recomeçar, eu e você? -Era uma pergunta.
-Sim, vamos recomeçar!

Ele me olhou nos olhos e soltou minhas mãos.
-Amigos? Ele perguntou novamente.
-Amigos, claro.-Apertei sua mão estendida e então fizemos o caminho de volta, devagar dessa vez.
Ele me levou até a porta do nosso quarto e se despediu, virou as costas e foi desmanchando a longa trança, olhei até ele sumir no longo corredor.
Então entrei, tomei banho e dormi, pela primeira vez um sono reparador.

Continua...

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Mergulho

(Cap 12) Mergulho

Hoje seria então o grande dia. Hoje eu me uniria para sempre com um "homem" para o resto de minha vida! O frio na barriga se intensificou, era quase um ataque de pânico!
Desde o jantar eu não tinha visto Niga, ele sequer voltou para o próprio quarto.
Nesses três dias eu aprendi muito sobre sua gente e cultura, como era suas vidas antes da evacuação total do planeta natal, o colapso de seu sol obrigou centenas de milhares a deixarem seu planeta para sempre, eles nunca poderiam voltar, tudo lá estava morto sem a luz solar. Eu pude notar a tristeza no semblante do homem encarregado de me ensinar, ele falou e depois se calou, deu as costas e não se virou por vários minutos. Fiquei condoída pela situação deles pela primeira vez. E não pude deixar de ver sua tristeza refletida no vidro da janela. Lágrimas cintilantes escorriam e desciam sem controle pelo rosto bonito, contrastando com a frieza sempre mostrada por todos.
As chamas estavam lá também, brilhantes e assustadoras, mas nesse momento tudo que pude sentir ao vê-las foi uma imensa vontade de consola-lo, dizer que estavam a salvo agora, que tudo vai ficar bem. Como se, dizendo várias vezes, fossem realmente se tornar real.
Hoje eu vou vê- lo, não sei o que dizer, o que fazer, minha mente está oca, como se eu estivesse vivendo a vida de outra pessoa.
Depois do jantar não sei se ele me odeia, se ele me deseja, só sei que ambas as expectativas me apavora!


Depois do café da manhã, fui levada para fora da fortaleza pela primeira vez desde que cheguei aqui. Vistiram me uma camisola tão fina que eu tinha certeza que todos viam tudo, como se estivesse completamente nua, não adiantou nada que eu protestasse e gritasse. Fui levada até o grande lago Esperança, o lago que abastece a cidade, para começar os rituais, (um dos muitos) do casamento.
Esse se constituía em mergulhar um de cada margem, e nadando, encontrar o outro no meio do lago, e juntos, mergulhar três vezes sem soltar as mãos, um de frente pro outro.
Quando chegamos ao lago, duas horas depois de viajar por dunas de areia sobre carros feitos para o deserto, um mergulho seria muito bem vindo.
Quando desci do veículo, meu rosto estava vermelho e quente, o cabelo solto e embaraçado, a camisola a muito colada no corpo devido ao suor. Andamos alguns metros até a margem e muitas pessoas aguardavam a realização da cerimônia.
Pessoas humanas e não humanas, ambas as raças vestidas à rigor sentadas à sombra de arquibancadas.


Repassei mentalmente tudo que meu professor me ensinou. Andar até a margem e esperar o Daine, (uma espécie de mestre de cerimônia), a me apresentar, e só então entrar na água.
Eu vi o Daine e minhas pernas começaram a tremer, comecei a respirar fundo tentando me acalmar. Todos vestiam azul em uma variedade imensa de tons, as mulheres usavam fita branca entremeadas nos mais variados penteados. Os homens deixaram os cabelos soltos e sem nenhum adorno, (como se precisassem!). Então o vi, na outra margem e meu coração disparou.
Ele vestia somente uma espécie de bermuda branca, os cabelos soltos ondulavam ao vento. Ele me encarava com um rosto sereno e controlado, como se cada passo fosse altamente treinado antes.
O Deine começou a cantar uma linda canção e todos se emocionaram, soava  uma melodia linda, mesmo dita naquela língua indecifrável.
Quando terminou ele me chamou com um aceno. Eu me aproximei devagar, com medo que minhas pernas falhassem.


-Lá vem Susan Petrus, que se unirá com Niga, da família de nós todos! Vamos contemplar o banho deles simbolizando a fartura de anos juntos, que sejam muitos como as gotas que formam esse lago, e como esse lago, que frutifiquem!- Todos aplaudiam e comemoravam.
Então essa era a minha deixa, mergulhei e fui até o fundo cristalino, a sensação da água fria era boa demais, subi para pegar ar com os pulmões ardentes. Ele já tinha mergulhado também, tudo que podia fazer era encontrá-lo. Olhei para os lados no fundo do lago e não vi nada além de algas e peixes, subi novamente e voltei a mergulhar. O pânico sempre crescente dentro de mim.
Olhei de novo e então o vi. Duas chamas inconfundíveis me olhavam de volta, me guiando até ele, seus cabelos dançando em volta de sua cabeça tinham um ar sinistro, ele movia lentamente as pernas, permanecendo no mesmo lugar por alguns segundos. Ele foi se aproximando com algumas braçadas e pegou em minhas mãos e ambos submergimos. As chamas tinham sumido. Seu rosto era indecifrável como a melodia. A água escorria por seu rosto refletindo a luz do sol, era uma visão mágica que não pertencia a esse lugar de guerra.

Demos as mãos e afundamos três vezes e então todos os alienígenas começaram a se jogar na água também, de roupas e tudo. Os humanos começaram a mergulhar também depois que notaram que era uma comemoração. Era como se todos respirassem depois de muito tempo segurando a respiração.
Ficamos nos olhando um tempo e depois resolvemos sair da água para se secar.
Eu não pude deixar de notar a felicidade de ambas as raças, todos rindo e mergulhando como crianças, todas as diferenças deixadas de lado por um instante, fazendo a paz.
Agora eu era esposa novamente, eu havia mergulhado numa nova vida...

Continua...