Sejam bem vindos ao meu blog!

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quarta-feira, 30 de dezembro de 2015

quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

(Cap 14) Primeiro sorrimos!

Os dias eram estranhos agora, eu ainda tinha medo, tinha que admitir! Mas minhas noites são tranquilas, o sono reparador. Meus cabelos vermelhos brilham mais e minha pele tem mais viço. Eu não sei o que acontecerá agora, não sei quando será a noite  núpcial, mas já não tenho tanto medo.
Sei que isso acontecerá de um jeito ou de outro, mas tenho certeza agora que Niga pelo menos será gentil, não vai me devorar ou me matar.
Toda manhã passeamos juntos pelos corredores, ele me busca após o desjejum, andamos pelos corredores, voltamos e nos despedimos. Nem sempre conversamos, somos o tipo de pessoas que ficam bem com o silêncio.
No terceiro dia de caminhada resolvi perguntar o que estava me consumindo.
-E então, quando será finalizado o casamento? Concluído, quero dizer.-Ele me olhou imediatamente observando atentamente meu rosto.
-Dentro de alguns dias, na verdade acho que na próxima semana.-Ele pegou minhas mãos e as levou próximas ao seu lindo nariz e inalou profundamente.
-Po-por que está cheireando minhas mãos? -Perguntei constrangida.
-Tem um cheiro suave que é só seu, impossível de destinguir.- Ele disse soltando minhas mãos de repente.
-Mas é imperceptível aos humanos, que inutilidade ter te contado!- Ficou constrangido e virou o rosto.
-Tudo bem, acho bom saber mais sobre você, seu povo. Somos tão iguais e mesmo tempo tão diferentes...
Ficamos ambos constrangidos.
-Pelo menos me diga com que se parece esse cheiro. -Ele virou o rosto.
-Não sei ao certo.
-Tente, por favor! -Ele continuava de costas olhando, da porta do nosso quarto, o longo corredor.
-Não conheço muitos cheiros daqui, é tudo muito novo pra mim. A atmosfera diferente fez com que muitos cheiros sejam agradáveis, outros comuns à vocês, sejam insuportáveis pra mim.-Um meio sorriso passou por seu rosto.
-Entendo-Disse a primeira coisa que me veio a cabeça.
-É um cheiro bom, não se preocupe. -Ele se virou e me encarou com aqueles olhos sombrios. As chamas estavam lá é claro! Mas menores, como se ele tentasse se conter.
Eu automaticamente saltei pra trás, o instinto de sobrevivência gritando dentro de mim.
Ele se aproximou lentamente, pegou meu rosto entre suas mãos e sussurrou de encontro a minha fronte. Primeiro palavras indecifráveis de sua língua natal e depois palavras em português, mas tão baixo que eu não conseguia ouvir, como se dissesse pra ele mesmo.
Sem soltar meu rosto ele me olhava fixamente e então falou baixinho.
-Nunca tenha medo de mim, minha fúria, muitas vezes, é dirigida a mim mesmo, entende?
Eu balancei a cabeça afimativamente. As chamas azuis dançavam dentro de suas iris.
-Claro, também é tudo muito novo pra você. -Ele constatou me soltando finalmente. As chamas desapareceram do mesmo jeito que surgiram, rapidamente.


Depois desse dia os passeios ficaram mais curtos. Niga me olhava de um jeito diferente do estranho habitual. Do nada as chamas apareciam, ele me encarava por alguns segundos, piscava e elas sumiam. No quinto dia eu soube que o último ritual aconteceria no dia seguinte. Algo a ver com o luar. Nada mais que isso. Nem uma palavra, por mais que eu tenha interrogado cada um daqueles que me atendem diariamente.
Deitei ansiosa demais e não consegui dormir, quando o sol aparecia no horizonte que eu consegui descansar um pouco. Aquele estado físico que fica entre o sono e a vigília.
A cabeça doía miseravelmente.
As portas foram abertas com um barulho que me fez saltar de susto. Um batalhão de mulheres entrou e já foram me arrastando banheiro adentro.
Uma massageava meu couro cabeludo enquanto outra me sentava em uma banqueta de frente ao enorme espelho trazido por elas.
Fui lavada, escovada, minhas pernas e axilas depiladas. Fui bezuntada com óleos e obrigada a deitar com uma substância verde e cheirosa emplastrando meu rosto.
Fosse qual fosse a máscara facial, me relaxou tanto, o cheiro suave acalmou a dor de cabeça que então adormeci.


Quando acordei minhas costas estavam doloridas por eu não ter mudado de posição, a noite havia chegado. Eu tinha dormido umas oito horas. Estava descansada apesar de tudo, me sentia leve.
Até me lembrar da noite que viria.
Senti uma onda de pânico surgir no meu estômago e revirá-lo.
Foi trazida uma bandeija com frutas, tomate, leite e um pão pequeno recheado com carne. O pão foi logo devorado com tomatinhos. Eu queria desesperadamente um chocolate. Minha boca salivava de lembrar da iguaria.
Eu sabia que o desejo por açúcar era só minha ansiedade falando.


Logo em seguida fui lavada novamente e um vestido vermelho foi enfiado pela minha cabeça. Quando me olhei no espelho minhas bochechas ardiam. Era um vestido feito para seduzir. Ele tinha um decote profundo, a cintura tinha escamas sobrepostas de um material resistente que apertava e afinava minha cintura. A saia moldava meus quadris e descia até os pés.
Até as joias tinham essa intenção. Um rubi em forma de gota descansava no meu decote pendurado por uma corrente finíssima e furta cor de um mineral que não era desse mundo. Os brincos eram peças idênticas que balançavam nas minhas orelhas.
Meus cabelos foram trançados com fios brancos entremeados. Nos pés as sandálias eram brancas e de muito bom gosto. Quando fui levada até o carro eu procurei atentamente por meu noivo e não o vi em lugar algum.

Depois de rodar duas horas pelo deserto os carros do comboio parou finalmente. Dunas de areia eram vistas em todas as direções, o vento da noite castigava meu rosto e braços desnudos.
Fui levada por dois deles até uma pequena luz que tremeluzia com o vento.
Meus pés estavm cheios de areia quando chegamos ao que parecia, à uma tenda montada no meio do nada.
A tenda tinha um tamanho razoável. Observei atentamente os detalhes dela. Era espaçosa e um cheiro delicioso começou a vir dentro com o vento.
Meu noivo surgiu na porta de pano e eu fiquei estática quando me dei conta que hoje seria a noite de núpcias!
É claro!

A única coisa que faltava, depois de uma infinidade de eventos, jantares e cerimônias, era a "noite" em si.
Meu noivo me olhava do mesmo jeito que ele tinha me olhado nos últimos dias, do jeito que só agora eu entendia. 
Ele me olhava com um desejo mal contido no olhar, as chamas brincavam em seus olhos, sumindo e aparecendo, como se ele tentasse contẽ-las, do mesmo jeito que ele tentava esconder seu desejo por mim.
Ele vestia branco, uma espécie de terno lindo e elegante. Seus cabelos também trançados nos mesmos padrões que os meus, mas com fios vermelhos.
Ficamos nos olhando até que constrangidos baixamos o olhar.
Ele dispensou meus guardiões com um aceno de cabeça e me conduziu pra dentro da tenda.

Lá dentro o calor do aqueçedor foi bem vindo, suspirei alto esfregando os braços.
Ele me olhou preocupado.
-Elas deveriam ter te colocado mais...-Apontou para o vestido que eu usava. -Mais... você me entende! No deserto pode fazer muito frio a noite. 
Ele se dirigiu a mesa posta com comidas que exalavam um cheiro delicioso.
A tenda continha uma cama imensa com muitos travesseiros e cobertores, tudo branco, a mesa com duas cadeiras e um tapete felpudo no centro, de frente pro aqueçedor.
Eu ainda tremia, não de frio, mas de medo da estréia!
Eu tremia tanto que ele me olhou, largou o prato que servia e veio rápido e começou a esfregar meus braços pra me aquecer.

-E-eu n-não estou c-com fri-frio! Eu disse gaguejando.
Ele parou e me olhou calmamente.
-Eu sei.- Se afastou e continuou a servir seu prato, sentou na mesa e começou a comer.
Eu fiquei parada no centro da tenda olhando-o.
-Sente-se antes que caia, perto do calor. -Ele apontou para o aqueçedor.
Eu estava tão tensa que tinha certeza que se eu sentasse eu quebraria ao meio. Eu me sentia como uma corda de violino repuxada.

Fiquei sentada no tapete por alguns minutos enquanto ele terminava de comer -Eu não te ofereci porque fui informado que você já comeu. -Ele me olhava apoiado na borda da mesa.
Eu não conseguia relaxar com a conversa fiada.
-Podemos...deveríamos...
Ele sentou ao meu lado e virou o rosto para mim, tão perto que eu podia sentir seu hálito de morango recém mastigado, no meu rosto.
-Não importa o que nos mandaram fazer, teremos nosso próprio momento, quando e onde quisermos, nos acostumaremos com a presença um do outro na mesma cama e só então... -Ele me disse com uma calma e certeza que fui relaxando aos poucos.
-Mas primeiro sorrimos! -Ele disse alto e se levantou, abriu uma bandeija pequena e tirou algo pequeno de dentro que sumiu escondido dentro de sua enorme mão.
Ele sorria quando abriu a mão na minha direção.
Eu não podia acreditar! Uma mini barra de chocolate surgiu ali. Eu a peguei e desembrulhei dando uma mordida em seguida.
Ele me olhava divertido.
-Obrigada. -Eu agradeci o presente.
Ele me olhava e então riu alto, uma gargalhada tão gostosa que ri junto até escorrer lágrimas e a barriga doer.
Olhei para meu marido tão relaxada qua agradeci mentalmente toda a distração.
-Primeiro sorrimos! -Repeti suas palavras.
E então ele sorriu novamente.

Continua...

Assistam meu vídeo novo e Feliz Natal!

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

(Cap 13) Recomeçar

Meu coração martelava nos meus ouvidos, quanto mais adiavam as "núpcias", mais meu pânico aumentava.
Depois do mergulho, fomos separados de quarto e enquanto não terminar os rituais do casamento não dormiremos juntos.
Niga foi pra uma espécie de despedida de solteiro no deserto. Mas tudo muito radical, nada de mulheres! Consistia em caçar cobras no deserto, eca! Existe gosto pra tudo nesse mundo! Os melhores amigos dele foram, uma tropa de vinte ou mais, voltariam no final da noite.
Eu daria qualquer coisa pra me distrair, pensar em outra coisa.

Eu aprendia cada vez mais sobre eles, sua rica cultura e língua. As aulas começavam logo depois do café da manhã e se estendiam até a noite. A noite eu estava cansada demais pra pensar em qualquer coisa, e não tínhamos ficado à sós pra conversarmos sobre o jantar, péssimo jeito de começar um casamento! As frases que aprendi primeiro foram: Eu amo você, Hai tee co mone! Estou com fome: Ledi che camú, as outras já esqueci.

No segundo dia após o mergulho, nos encontramos nos preparativos do segundo ritual de casamento, esse consistia em comer e beber no mesmo prato e copo as comidas especiais pra ocasião. Eles levam muito a sério a coisa de "se tornar apenas um", só de sentir o cheiro já me fez enjoar, o que quer que fosse cheirava como fígado e eu odiava fígado.
Todos bem vestidos e também comiam no amplo salão oval, o mesmo onde me informaram que eu me casaria para selar a paz. Todos nos sentamos e então todos conversavam e olhavam pra nós sentados no meio do salão. Era como estar num restaurante, todos pareciam se divertir.
Niga chegou e vestia preto dessa vez, os cabelos trançados lindamente no estilo viking, a cor do meu vestido tambem era preto, já os convidados vestiam branco. Nós dois eramos dois pontos negros na imensidão de branco. Eu ficava imaginando que, quem quer que fosse que escolhesse os trajes, devia se divertir com o contraste de cores.

Niga se sentou e eu também, um ao lado do outro. O prato era enorme e a taça também, o material transparente e  furta-cor do prato e taça não era desse mundo, parecia que tinha uma galáxia dentro deles. Ele me olhava do mesmo jeito estranho de sempre, não teve nem um cumprimento, nada.
Ele se levantou e abriu as travessas dispostas na mesa e me oferecia com uma falsa cortesia. Me irritou só até eu perceber que ele sorria com o canto dos lábios, parecia querer aliviar a tensão. Eu me quebraria ao meio se ficasse mais tensa.
Eu agradeci e deixei que ele escolhesse o que comeríamos.
Todos os presentes, humanos ou não, nós observavam atentamente.
Ele fatiou uma ave e colocou no imenso prato, sentou-se com a cadeira levemente na diagonal, para comermos quase de frente um para o outro.

Eu olhei pro prato e fiquei feliz com a ave e tomates dispostos no prato, nada vivo e nenhum cheiro desagradável. Ele fatiou a carne e me olhava atentamente, colocou a carne na boca, mastigou e engoliu. Espetou a carne e me ofereceu na boca fazendo aviãozinho. Eu fiquei parada olhando indignada pra mão dele suspensa no ar.
-Por favor? -Desse jeito eles vão pensar que você me odeia e a toda minha gente! -O sarcasmo implícito na voz serena.
-Eu posso comer sozinha!- Retruquei calmamente para não fazer cena.
-É apenas galinha, todos estão olhando, abra a boca, por favor?
Abri a boca e peguei o pedaço de galinha e mastiguei silenciosamente e engoli. Niga me olhava o tempo todo e eu não conseguia raciocinar. Era um pedaço atrás do outro e eu quase não tinha tempo de respirar.
-Algo para beber por favor? -Pedi segurando seu pulso antes de ele me enfiar mais galinha goela a dentro.
-Claro!- Ele pegou a garrafa reluzente e despejou o líquido transparente dentro da taça enorme. Trouxe até minhas mãos e colocou minhas mãos na base da taça e me ajudou a erguer até meus lábios.
Quando bebi a bebida deliciosa me engasguei, tossi e recuperei a compostura antes de beber mais. Niga me olhava divertido e parecia prestes à me acudir e eu o acalmei segurando na sua mão enquanto tossia, para que ele não levantasse e fizesse qualquer coisa que estivesse em mente, como me chacoalhar ou sei lá...

Quando meu fôlego voltou ao normal, eu tinha lágrimas nos olhos e meu rosto ardia de vergonha. Soltei a mão dele quando notei que eu ainda apertava fortemente seus dedos. Ele pareceu nem notar, a sua mão esquerda continuou estendida em minha direção.
-Beba mais um pouco para acalmar sua garganta.-Ele ofereceu.
-Daqui a pouco eu bebo, vou esperar todos que estão me olhando, cuidarem de suas vidas! -Ri sem graça. Eu era péssima fazendo piadas.
-Nós sempre seremos motivos de especulação, afinal somos nós que mantemos todos unidos. -Ele me disse e sorriu sem graça, parecia que era a primeira vez que conversávamos.
E de fato era a primeira vez que eu não estava com o cérebro corrompido com remédios e drogas e ele também parecia sóbrio.
Eu não queria quebrar a camaradagem e procurei por alguma coisa na minha mente para conversar.
-Como foi? Pegou muitas cobras?- Ele parou no meio da mastigada e me olhou sem entender, depois sorriu e engoliu.
-Sim, algumas. -Bebeu da taça, deixando-a quase pela metade. A bebida era deliciosa e tinha gosto de limão, parecia um champagne.
Eu continuei a encará-lo, eu queria saber mais.
Ele me olhou e mordeu um tomatinho, suco escorreu pelo seu queixo perfeito.
-Aqui, pegue. -Ofereci o guardanapo. Ele pegou e limpou o queixo olhando fixamente para mim.
-O que sua mente curiosa quer saber? -Ele perguntou divertido.
-Tudo...tudo que quiser me contar. -Falei pegando uma nectarina e mordendo.
-Fomos ao deserto com esses carros da areia, quando chegamos um dos carros ficou preso na areia e começou a afundar, Midal ficou apavorado quando afundava e nós não conseguíamos ajudá-lo porque era muito engraçado, se ele parasse de gritar ele veria que ele poderia sair de lá andando!-Ele gargalhou lembrando e a risada era tão contagiante que ri também.

Olhei em volta e só então notei que muitos já tinham deixado o salão, pareciam satisfeitos com o que quer que estavam vendo. Fiquei feliz em saber que podíamos conversar a pesar de tudo. Não tocamos no assunto do jantar e eu fiquei satisfeita por não provocar sua ira. Ele parecia um garoto, relaxado, comendo e bebendo.
Eu não queria estragar o clima, já que tinhamos uma vida toda pela frente poderíamos tentar pelo menos.

Quando estávamos sozinhos no imenso salão ele se levantou e me ergueu pela mão também.
-Está satisfeita? Ele me olhava nos olhos com o olhar divertido como esteve durante todo o jantar.
-Si-sim. Gaguejei.
-Ótimo! Vamos? ele me olhava esperançoso, como se temesse que eu recusasse.
-Sim, pra onde? Ele me puxou pela mão e corria sem parar, parou em frente uma sala trancada e eu já estava totalmente sem fôlego e pelo jeito que subimos sem parar, tinha quase certeza que estávamos no telhado.
-Onde estamos? Perguntei enquanto ele destrancava a porta e entrava, entrei em seguida.
-No meu lugar preferido nesse mundo. -Ele me disse e seu semblante ficou triste.
-Você quer me mostrar? -Eu perguntei e seu rosto se iluminou novamente.
-Sim, vou te mostrar. -Ele apagou a luz e a parede se moveu e a vista era impressionante, de tirar o fôlego.
Dalí era possível ver a fortaleza toda abaixo de nós, e no horizonte a cidade pequenininha.
-Nossa! -Eu disse olhando pelo vidro todo o palácio abaixo de nós.
-Sim, nossa! -Ele riu sem graça.- Eu venho aqui quando quero ficar sozinho, quando tenho saudades de casa.
O telhado se moveu e um imenso telescópio apareceu apontando para o céu azul.

-Venha ver meu lar. -Ele me chamou sentando na poltrona de observação.
Eu andei até ele e ele me sentou em seu colo.
-Olhe entre a constelação de Órion. -Ele me segurava na cintura, seu corpo era deliciosamente quente, contrastando com minha pele fria da noite.
Eu busquei a constelação que ele me disse e esperei que focasse. Assustei quando vi a estrela meio apagada perdida entre as outras estrelas. Eu a reconheci do objeto estranho do quarto de Niga, aquele que projetou a imagem na parede.
Levantei de seu colo e fiquei olhando pra ele. Seu olhar estava tão triste que meu coração doeu por ele.
-Daria tudo pra voltar pra lá, mas é impossível! Tudo que vivia lá agora está morto, conforme a estrela se apaga, o planeta morre lentamente. E então uma lágrima escorreu teimosa em sua linda face.
Ele continuou sentado sem me olhar.

-Esse é seu lar agora, você está em casa. -Eu me impressionei com a verdade daquelas palavras. Tudo que eu queria era viver em paz com ele e com os outros de sua espécie.
Eu já tinha perdoado ele a muito tempo, só agora conseguia perceber isso. Talvez era por isso que eu não me sentia bem perto dele, eu gostaria que ele soubesse. No fundo sempre quis que ele soubesse disso.
Pensei em tudo que me aconteceu e então me dei conta que tudo, a guerra, as mortes, era consequência dos erros humanos.
E até minhas perdas tinham a ver com erros estupidamente humanos.
Não podia culpá-lo eternamente por minhas frustrações.
-Ele me olhou com lágrimas nos lindos olhos e então me puxou e me abraçou, assim sentado e eu em pé.
Chorou e soloçou por longos minutos. Eu chorava baixinho também abraçando e afagando sua cabeça.
Quando ele abriu os olhos as chamas estavam lá, ameaçadoras. Mas pela primeira vez não tive medo. Era apenas alguém que também sofria, como eu.

Choramos por tudo, até a cabeça doer. Quando nos acalmamos ele olhou para o chão constrangido.
Se afastou um pouco e saiu do me abraço. Eu sentei no seu lugar ainda quente e fiquei esperando que ele me dissesse algo.
Ele se virou pra mim, seus olhos azuis vermelhos e um canto da boca estava erguido num meio sorriso.
-Arrunei seu vestido- Ele me disse apontando para meu colo encharcado.
-Tudo bem, seu penteado já era também. -Apontei para seu cabelo desarrumado e sorri.
Rimos feito bobos.
Ele se aproximou e pegou em minhas mãos.
-Me perdoe por tudo, pra começar por sequestrar você... -Eu coloquei a mão nos seus lábios calando-o.
-Está perdoado pelo sequestro, as outras coisas você não é culpado.
Ele sorriu.
-Começamos errado, minha raça e a sua.- Quando disse isso um imenso alívio tomou conta de mim, era a pura verdade.
-Não podemos apagar a guerra e nem a rixa entre nosso povo... -Foi a vez dele me calar.
-Mas podemos recomeçar, eu e você? -Era uma pergunta.
-Sim, vamos recomeçar!

Ele me olhou nos olhos e soltou minhas mãos.
-Amigos? Ele perguntou novamente.
-Amigos, claro.-Apertei sua mão estendida e então fizemos o caminho de volta, devagar dessa vez.
Ele me levou até a porta do nosso quarto e se despediu, virou as costas e foi desmanchando a longa trança, olhei até ele sumir no longo corredor.
Então entrei, tomei banho e dormi, pela primeira vez um sono reparador.

Continua...

sexta-feira, 4 de dezembro de 2015

quarta-feira, 2 de dezembro de 2015

Mergulho

(Cap 12) Mergulho

Hoje seria então o grande dia. Hoje eu me uniria para sempre com um "homem" para o resto de minha vida! O frio na barriga se intensificou, era quase um ataque de pânico!
Desde o jantar eu não tinha visto Niga, ele sequer voltou para o próprio quarto.
Nesses três dias eu aprendi muito sobre sua gente e cultura, como era suas vidas antes da evacuação total do planeta natal, o colapso de seu sol obrigou centenas de milhares a deixarem seu planeta para sempre, eles nunca poderiam voltar, tudo lá estava morto sem a luz solar. Eu pude notar a tristeza no semblante do homem encarregado de me ensinar, ele falou e depois se calou, deu as costas e não se virou por vários minutos. Fiquei condoída pela situação deles pela primeira vez. E não pude deixar de ver sua tristeza refletida no vidro da janela. Lágrimas cintilantes escorriam e desciam sem controle pelo rosto bonito, contrastando com a frieza sempre mostrada por todos.
As chamas estavam lá também, brilhantes e assustadoras, mas nesse momento tudo que pude sentir ao vê-las foi uma imensa vontade de consola-lo, dizer que estavam a salvo agora, que tudo vai ficar bem. Como se, dizendo várias vezes, fossem realmente se tornar real.
Hoje eu vou vê- lo, não sei o que dizer, o que fazer, minha mente está oca, como se eu estivesse vivendo a vida de outra pessoa.
Depois do jantar não sei se ele me odeia, se ele me deseja, só sei que ambas as expectativas me apavora!


Depois do café da manhã, fui levada para fora da fortaleza pela primeira vez desde que cheguei aqui. Vistiram me uma camisola tão fina que eu tinha certeza que todos viam tudo, como se estivesse completamente nua, não adiantou nada que eu protestasse e gritasse. Fui levada até o grande lago Esperança, o lago que abastece a cidade, para começar os rituais, (um dos muitos) do casamento.
Esse se constituía em mergulhar um de cada margem, e nadando, encontrar o outro no meio do lago, e juntos, mergulhar três vezes sem soltar as mãos, um de frente pro outro.
Quando chegamos ao lago, duas horas depois de viajar por dunas de areia sobre carros feitos para o deserto, um mergulho seria muito bem vindo.
Quando desci do veículo, meu rosto estava vermelho e quente, o cabelo solto e embaraçado, a camisola a muito colada no corpo devido ao suor. Andamos alguns metros até a margem e muitas pessoas aguardavam a realização da cerimônia.
Pessoas humanas e não humanas, ambas as raças vestidas à rigor sentadas à sombra de arquibancadas.


Repassei mentalmente tudo que meu professor me ensinou. Andar até a margem e esperar o Daine, (uma espécie de mestre de cerimônia), a me apresentar, e só então entrar na água.
Eu vi o Daine e minhas pernas começaram a tremer, comecei a respirar fundo tentando me acalmar. Todos vestiam azul em uma variedade imensa de tons, as mulheres usavam fita branca entremeadas nos mais variados penteados. Os homens deixaram os cabelos soltos e sem nenhum adorno, (como se precisassem!). Então o vi, na outra margem e meu coração disparou.
Ele vestia somente uma espécie de bermuda branca, os cabelos soltos ondulavam ao vento. Ele me encarava com um rosto sereno e controlado, como se cada passo fosse altamente treinado antes.
O Deine começou a cantar uma linda canção e todos se emocionaram, soava  uma melodia linda, mesmo dita naquela língua indecifrável.
Quando terminou ele me chamou com um aceno. Eu me aproximei devagar, com medo que minhas pernas falhassem.


-Lá vem Susan Petrus, que se unirá com Niga, da família de nós todos! Vamos contemplar o banho deles simbolizando a fartura de anos juntos, que sejam muitos como as gotas que formam esse lago, e como esse lago, que frutifiquem!- Todos aplaudiam e comemoravam.
Então essa era a minha deixa, mergulhei e fui até o fundo cristalino, a sensação da água fria era boa demais, subi para pegar ar com os pulmões ardentes. Ele já tinha mergulhado também, tudo que podia fazer era encontrá-lo. Olhei para os lados no fundo do lago e não vi nada além de algas e peixes, subi novamente e voltei a mergulhar. O pânico sempre crescente dentro de mim.
Olhei de novo e então o vi. Duas chamas inconfundíveis me olhavam de volta, me guiando até ele, seus cabelos dançando em volta de sua cabeça tinham um ar sinistro, ele movia lentamente as pernas, permanecendo no mesmo lugar por alguns segundos. Ele foi se aproximando com algumas braçadas e pegou em minhas mãos e ambos submergimos. As chamas tinham sumido. Seu rosto era indecifrável como a melodia. A água escorria por seu rosto refletindo a luz do sol, era uma visão mágica que não pertencia a esse lugar de guerra.

Demos as mãos e afundamos três vezes e então todos os alienígenas começaram a se jogar na água também, de roupas e tudo. Os humanos começaram a mergulhar também depois que notaram que era uma comemoração. Era como se todos respirassem depois de muito tempo segurando a respiração.
Ficamos nos olhando um tempo e depois resolvemos sair da água para se secar.
Eu não pude deixar de notar a felicidade de ambas as raças, todos rindo e mergulhando como crianças, todas as diferenças deixadas de lado por um instante, fazendo a paz.
Agora eu era esposa novamente, eu havia mergulhado numa nova vida...

Continua...

domingo, 29 de novembro de 2015

 (Cap 11) Revelações no Jantar

Acordei suada e pegajosa, o lençol embolado no meu corpo, e com aquela sensação de ter dormido demais.Me remexi na cama e então me lembrei onde estava: No quarto de Niga, ou melhor, no nosso quarto!
Olhei ao redor e no espaço vazio ao meu lado e bocejei com alívio. Eu estava sozinha na enorme cama. Peguei o roupão no móvel ao lado da cama e vesti-o. Caminhei até a janela branca e olhei pro céu, seria mais um dia quente e suarento como todos os outros.
Tomei banho sozinha e me vesti com a primeira roupa que encontrei, um vestido longo e preto de tecido suave, um dos presentes de casamento também, sem dúvida! Me olhei no espelho enorme do banheiro e pude contemplar como o vestido caiu bem, realçando minha pele branca e suave.
Não calcei nenhuma sandália nos pés e andei alguns minutos descalça no chão de pedra fria. 
Meus cabelos vermelhos estavam soltos pra secarem naturalmente. Odiava as ocasiões em que tinha que prendê-los, me causavam uma dor de cabeça terrível!

Fiquei explorando o enorme aposento, abrindo gavetas, caixas, nem percebi as horas passarem. Dei por mim somente quando uma mulher "alien" me chamou num tom alto e ríspido, como quando chamamos alguém várias vezes sem conseguir atrair a atenção da pessoa. Eu a olhei e vi as chamas azuis passarem rapidamente por seus olhos, ela piscou e as chamas sumiram, ela reassumiu o controle e repetiu;
-O comandante Nigan deseja falar-lhe durante o jantar dessa noite.
Eu a olhei como uma idiota.
-Mas nem tomei...
-Café da manhã!- Ela completou.-Estranho nome para a refeição primeira.
Me jogou uma maçã que peguei no ar.
Dei uma dentada desconfiada. Mastiguei e engoli.
-Mas nem sei...nem sei o que vestir, onde ir...
Ela riu, ou talvez zombou de mim no seu íntimo, com um meio sorriso.
-É por isso que estou aqui.

Ela me puxou para o banheiro onde fui lavada, escovada, penteada e vestida. Ela ficava me contando várias coisas sobre eles, como, por exemplo, eu deveria deixar os mais velhos comerem primeiro, como as bebidas eram servidas, e como deveriam ser degustadas.
Ela me ensinava a "etiqueta" social deles. E continuou em um sermão longo e cansativo que eu não consegui absorver quase nada.
O sotaque dela também não deixava que eu aprendesse muito, toda hora eu tinha que ficar pedindo que ela repetisse e então as chamas assustadoras apareciam e então, na terceira vez desisti e liguei o piloto automático.
Bastava que eu balançasse a cabeça e pronto.
Quando ela terminou ela me virou de frente pro espelho e pude ver maravilhada a minha transformação.

A beldade do espelho tinha os cabelos vermelhos trançados em cascata com minúsculas flores e pedrinhas furta cores e brilhantes entremeadas nos fios. O vestido roxo delineava cada curva, com uma leve calda.
No pescoço brilhava um colar das mesmas pedrinhas cintilantes dos cabelos, e uma ametista enorme pendurada no colo, realçava a pele branca.
-Nossa! Falei sozinha no espelho.
-Ele tem... como dizem vocês? Minha transformadora pensou um pouco.
-O que?- Perguntei cautelosa.
-Sorte. -Me pegou pela mão antes que eu respondesse e me arrastou por corredores e salas, quartos e escadas e me perdi totalmente, jamais conseguiria retornar sozinha.

Quando chegamos a um imenso salão branco ela parou, me olhou nos olhos e apontou a frente.
Eu olhei e não vi nada, apenas colunas de pedra branca num imenso terraço. A vista impressionava, ali era possível ver a cidade toda, pequena no horizonte.
Ela fechou as portas de vidro enormes que eu sequer tinha notado, bem atras de mim, e em seguida as cortinas brancas.
Eu andei alguns passos a frente e então o vi.
Ele bebia uma bebida e olhava relaxado na postura, de costas para mim. Observava a paisagem.
Os cabelos estavam molhados e trançados no estilo "viking", com três tranças finas nas laterais, que se juntavam com o resto dos cabelos no alto da cabeça e descia num rabo de cavalo.
As roupas eram impecáveis e brancas, contrastando elegantemente com meu vestido roxo.
Não sabia se devia me anunciar ou esperar que me notasse, eu não conseguia me lembrar da regra de etiqueta nesses casos.

-Boa noite, Susan! -Ele me cumprimentou ainda de costas.
-Boa noite! Disse educadamente mas com uma fria polidez.
Ele se virou e me olhou nos olhos e mostrou a cadeira no lado oposto da pequena mesa oval.
Os talheres, as taças  e os pratos eram pretos e brilhantes, de um metal que não existe na terra. 
Me sentei reta e o olhei as comidas dispostas na mesa. Coisas estranhas e ainda vivas se mexiam nas travessas, uma travessa cheirava deliciosamente a carne assada. Seria essa que talvez eu experimentaria.
Ele se serviu de mais bebida, e um cheiro delicioso de canela invadiu meu nariz. Eu fiquei parada e observava o pomo de adão subir e descer com cada gole, um atras do outro.
-Você deve se alimentar!- Ele disse me olhando nos olhos de um jeito frio que gelou meu corpo.
-Não estou com fome! -Menti o melhor que pude, mas meu coração acelerou com a mentira e a voz saiu como de uma criança birrenta.
Os lábios lindos e perfeitos se curvaram nos cantos, mas seus olhos não sorriam.
Ele estava zangado, muito zangado!
-Ha, por favor! Posso ouvir seu estômago parcialmente vazio se retorcer. -Ele disse a última palavra entre dentes.
Ele ficou de pé e deu a volta na mesa, destampou a travessa que cheirava deliciosamente e cortou um pedaço grande e suculento, colocou no meu prato e cambaleou.
Eu fiquei parada e pensei em estender a mão, mas antes que caísse ele se sentou novamente.
Eu fiquei observando sem ação sem entender muito.
-É apenas galinha, coma logo! Ele me disse irritado.
Eu peguei o talher estranho, que parecia um garfo com um dente só e comecei a comer devagar e então mais depressa, era mesmo galinha e estava deliciosa!

Eu podia senti-lo me observando enquanto eu comia de cabeça baixa.
Ele não disse nada enquanto não empurrei o prato sinalizando que tinha terminado de comer.
A taça foi cheia com a mesma bebida que ele bebia sem parar. O prato dele ainda vazio me preocupava de um jeito que eu não compreendia muito bem.
-Você não vai comer? -A pergunta escapou antes que eu tivesse pensado.
-Não. -Disse simplesmente.
Eu bebi um gole da bebida e senti minha cabeça girar e a língua pinicar. Uma sensação estranha de leveza tomou conta de mim, fez com que eu lembrasse das drogas do hospital.
-Vá devagar, pode ser estranha pra você. -Ele ficou de pé e andou até o enorme terraço e acenou para que eu fosse até ele.
Eu  larguei a bebida na mesa e dei alguns passos vacilantes em direção a beirada.
Ele olhava o horizonte e não via, estava preocupado demais, e eu tinha certeza que nossa situação o aterrorizava também.
-Você vai começar a aprender sobre nós. -Ele me disse sem me olhar, ficou calado tanto tempo que me perguntei se ele tinha me esquecido ali.
-Eu...está bem. -Concordei.
Ele se virou finalmente e pegou minhas mãos entre as suas. suas mãos estavam geladas e tremiam e isso me apavorava também.
-Temos que fazer funcionar... você entende? -Ele sussurrou as palavras tão próximo que senti seu hálito de canela em meu rosto.
-Si-sim! -Respondi fraca.

Ele soltou minhas mãos e segurou meu rosto fortemente, quase me machucando. me avaliava de cada lado do rosto. Eu senti lágrimas brotarem em meus olhos e fiquei com raiva por ser tão transparente nas emoções.
Ele relaxou um pouco o toque mas não me soltou. Quando uma lágrima escorreu ele limpou com um dedo e só então pareceu ter retornado ao seu estado normal, se é que ele tinha um!
-Não vou machucar você! -Ele me disse virando as costas.
-Fomos escolhidos por um bem maior que nós dois: a união de duas raças!
-Eu sei...gaguejei.
-Não sabe! Você não sabe de nada!Aquele saco de ossos é sagrado e raro, um presente inestimável e estava jogado no chão do meu quarto! Ele explodiu e as chamas dançavam nos seus lindos olhos.

Então o jantar era pra isso! Pra dar bronca! Esqueci do medo quando senti a fúria crescer dentro de mim!
-Pro inferno você e toda essa situação! Odeio você, odeio sua gente e odeio esse lugar!
Não consegui suportar mais a tensão e desabei no chão e chorei.
Chorei por tudo novamente, as feridas reabertas, sangraram e minha alma doeu.
Ele se aproximou de mim em dois passos e me ergueu do chão e seus olhos ainda brilhavam assustadoramente.
Tudo que pude sentir foi raiva ao ver aquele rosto me encarando. Ergui a mão lá atras e dei o tapa mais forte que consegui.
Seu rosto virou com a força do tapa e ele cambaleou, me livrando do seu aperto.
-Muitos morreram por menos! Ele me disse e então caiu sentado, parecia realmente bêbado agora.
-Seria mais fácil! Ele disse me encarando e as chamas sumiram.
Ele ficou de pé e me olhou distante, como se temesse outro tapa ou talvez, sua própria reação. parecia acuado e com medo.
-O que seria mais fácil? Talvez devesse mesmo me matar! -Eu gritei a plenos pulmões.
Ele me olhou nos olhos e caminhou até mim lentamente, parecia um felino grande, um lince talvez, indo até a presa.
-Seria mais fácil... se eu não sonhasse com você! E tirou um chocolate embrulhado do bolso e colocou na minha mão.

Eu fiquei ali parada vendo-o se afastar, abrir a porta e sair e só então me lembrei de fechar a boca.

Continua...






(Cap 10) Estrela Peculiar

Faltando dez dias para a cerimônia começaram a chegar diversos presentes. Capitães, soldados, humanos também, enviavam uma série de presentes. Coisas úteis como roupas frescas, velas perfumadas, cortinas brancas, prendedores de cabelo com pedras preciosas, lençóis bordados, ventiladores, coisas que lotavam a minha cela. Coisas estranhas também chegaram, como por exemplo, um monte de ossinhos num saquinho, que quando abri, quase morri de susto e joguei longe.
Eu abria cada um e matava a curiosidade e depois abandonava-os aonde quer que caíssem.

Na manhã seguinte fui informada de que eu estava mudando de aposento. Parecia que não era mais adequado uma pessoa da minha importância ainda morar numa cela. Me levaram vários andares acima, numa ala restrita e bem mais espaçosa. O branco predominava também, mas era possível notar o luxo do ambiente, semelhante aos salões do Alto Comando.
Fui levada até um quarto no fim do corredor, a porta grande foi aberta e eu levada pra dentro com um batalhão que arrumou minhas coisas rapidamente. Tudo foi arrumado no guarda roupas e nas cômodas dispostas na longa parede branca.
Saíram na mesma rapidez que entraram fechando a porta em seguida. fui testá-la só pra ter certeza e ri. Totalmente trancada. Parecia que eu não poderia ficar explorando por ali.

Depois de tomar banho e me secar, vesti uma longa camisola de seda branca, tinha vindo junto com os presentes de casamento e eu me vi alisando o tecido suave. Era tão bom estar longe da cela pequena que sorri sozinha. Olhei meu reflexo no espelho e notei as bochechas levemente rosadas. A minha saúde estava totalmente recuperada graças a bebida verde que me faziam beber todo dia pela manhã.  O fluxo de sangue não voltara mais e a dor na região intima tinha sumido por completo, como se eu nunca tivesse perdido uma criança e algo me dizia que meu fluxo não voltaria mesmo depois do casamento. Meus cabelos  brilhavam e tinham recuperado o brilho e maciez. Na pressa de procurar um pente pros meus cabelos, fui abrindo todas as gavetas e me deparei com aquele mesmo saquinho horripilante de ossos novamente. Gritei apavorada e joguei em cima da enorme cama.

Decidi procurar no banheiro e fui abrindo as gavetas do armário de toalhas. Ele estava cheio de coisas estranhas como um vidro cheio de minúsculas borboletas vivas, um livro preto escrito muitas coisas numa escrita impossível de decifrar, um cilindro que brilhava como uma lanterna que ao tocar, projetava a imagem de várias estrelas lindas e coloridas, umas brilhavam distantes demais, outras tinham uma névoa rosada que as envolviam e pareciam dançar na parede branca, mas uma chamou a minha atenção particularmente. Ela não brilhava como as outras, ela tinha um brilho azul fraco como se a qualquer mmomento fosse se apagar, fiquei triste por ela.
Resolvi guardá-lo no mesmo lugar que havia pegado, fosse de quem quer que  fosse esse quarto, ele não gostaria de ser bisbilhotado.
Penteei meus cabelos e caí na cama, não tinha nem escurecido mas me deixei levar pelo cansaço.


Quando acordei percebi mais alguém no quarto e me assustei.
-Quem está aí?- Perguntei  sentando rapidamente na cama fazendo minha cabeça girar. Caí pra trás e fiquei esperando a tontura passar. -Deveria ter dormido menos, disse pra mim mesma.- A lua já estava alta no céu vista pela enorme janela.
Quando levantei novamente, notei o saquinho de ossos dispostos no meu criado mudo e me encolhi.
Cambaleei fora da cama e a sombra perto da parede se moveu.
Eu estava frente a frente com meu noivo. Ele me olhava de um jeito diferente, talvez cansaço.
-O que faz em meu quarto? Ele riu.
-O que é tão engraçado? Ele cruzou os braços e se sentou na cama.
-Me diga você, esse é o meu quarto!
-O quê? Ele riu de novo.
-Parece que dormiremos aqui a partir de hoje, não crie caso, estou cansado!
Ele disse retirando as botas e colocando-as cuidadosamente no chão.
Eu fiquei parada olhando-o como tinha rapidez em fazer tudo oque se propunha a fazer. Percebi que encarava descaradamente e fiquei constrangida.
Ele virou de frente para mim e me olhou com um olhar estranho que me deu medo. -Não precisa ficar parada aí, pode se deitar se quiser! -Ele disse ríspido.
-Nã-não, obrigada!- Gaguejei.
Ele se aproximou e me sentou na cama com firmeza.
-Só tem uma cama que teremos que dividir, queremos ou não! Eu não mato você desde que você não tente me matar enquanto durmo, e não tente nada estúpido com sua mente estúpida ou vai se arrepender mui-tis-si-mo! -Ele soletrou a última palavra e duas chamas brilharam assustadoramente nos seus olhos.
Eu congelei na posição que estava e ele ficou me olhando impaciente.
-O que quer de mim? -Perguntei segurando o choro.
-Você não disse que compreendeu...
-Eu com-pre-en-di! -Retruquei.
-Ótimo!- Ele me disse deitando na cama de bruços e dormindo logo em seguida.

Podia escutá-lo ressonar tranquilo e pausadamente, o que indicava que dormia profundamente. De vez em quando ele dizia algo ininteligível naquela língua estranha, como se sonhasse com alguma coisa. Uma coisa boa, porque ele sorria e se mexia muito na enorme cama.O riso desfazia a carranca habitual e mostrava os traços perfeitos do rosto bonito. Um rosto lindo e suave, como de um garoto. As vezes eu me esquecia que ele também é jovem, da minha idade, talvez um pouco mais, talvez um pouco menos, mas assim como eu, um escravo do dever.
Resolvi me deitar na beirada da cama para não incomodá-lo e acabei adormecendo e sonhando com estrelas e uma com uma luz diferente e peculiar.






sábado, 21 de novembro de 2015

(Cap 09) "Reconquista"

Minha cabeça estava um turbilhão, eu não conseguia raciocinar, não sabia nada de meu "noivo" e isso me apavorava ainda mais. Ele continuava sendo assustador, representa tudo que perdi até agora, e me imaginar me unindo com ele em uma união como o casamento, faz meu estomago revirar. Era difícil saber o que se passava na cabeça dele: Surpresa, raiva, talvez ele me odiasse tambem, o que não será nada fácil pra nós dois. E imaginar que nossos corpos se encontrarão, nus, na mesma cama, me faz arrepiar, e não de um jeito bom. Nunca me imaginei com outro homem que não fosse Diogo meu marido, ele era tudo pra mim, tudo que eu precisava e ansiava. Era ele que fazia meu coração acelerar com um beijo... E imaginar que nunca mais vou vê-lo, faz meu coração em estilhaços, falhar perigosamente. Talvez eu morra na cerimonia, e imaginar a situação me faz rir; tanto esforço da parte deles pra terminar assim, por uma fatalidade do destino, não deixa de ser engraçado, de um jeito totalmente mórbido!


Eu continuei minha rotina diária por uma semana, acordar, tomar banho, comer, beber, caminhar. Nenhuma palavra dele, nenhuma visita, nada. Eu não sei o que realmente queria que ele fizesse. Muita coisa depende de nós dois e ele parece não se importar. E a angústia de não saber o que se passa na cabeça dele me corrói por dentro. Talvez devesse confrontá-lo, perguntar diretamente, mas me sobra covardia e me falta juízo! Não saberia dizer qual seria sua reação, talvez me xingasse, ou talvez me atirasse pela cela pra me arrebentar no piso dezesseis andares abaixo. Ninguem jamais saberia, ele diria apenas que não suportei a dor, que fui vencida pelas perdas recentes. Ninguém ousaria questioná-lo, ninguem choraria por mim.
Mandei vários recados informais, pedi e implorei que falassem com ele, que ele viesse me ver, mas nada! Nenhum  bilhete, nenhuma palavra.
O que quer passasse pela cabeça dele, pelo jeito, eu só saberia quando ele quisesse.

Tudo estava muito bem, os humanos já tinham direito de ir e vir, tropas e mais tropas aliens patrulhavam dia e noite todo o território e o deserto também. Por causa da aliança, eles estavam ensinando sua tecnologia e conhecimento para os humanos, não que fossem mais avançadas, simplesmente por ser diferente.
Eles também aprendiam conosco muitas coisas, como por exemplo a relaxar, já era possível passar por eles e vê-los com aquelas chamas assustadoras nos olhos e rindo.
Casas tinham sido reconstruídas, tudo indo bem demais, mas em troca, todo homem em idade produtiva deveria se apresentar ao exercito, ambos os lados formariam um único exercito, eles estavam se fortalecendo, unindo forças. Nas escolas, crianças alienígenas começavam a estudar com as crianças humanas, na verdade dava pra perceber perfeitamente o que eles estão fazendo. Estão aprendendo tudo o que podem sobre nós, em todas as idades e fases da vida. E isso é muito inteligente, conhecer as forças e principalmente as fraquezas dos inimigos. Eles não querem ser pegos de surpresa em nada, eles querem antecipar qualquer coisa que leve a uma rebelião, a uma "reconquista". Nos hospitais muita gente foi beneficiada por sua medicina quase milagrosa.
Não tinha sentido falta dos bebês deles até eles aparecerem. 

Vieram numa nave diretamente pra dentro da fortaleza, com guardas muito bem armados. Vi alguns pais reencontrando seus bebês e não pude deixar de achar fofo! Alguns esperavam com um buquê de rosas minúsculas amarelas e acenavam pra eles antes de desembarcarem. Outros esperaram até estar fora de vista dos curiosos pra correrem pra eles e pegá-los no colo como qualquer humano faria. Uma cena linda que ficou na minha mente o dia todo.
Adormeci com lindos rostinhos rosados com olhos assustadores povoando meus pensamentos.

Sonhei que embalava um bebê com uma linda canção de ninar mas não adiantava, ele continuava a chorar muitíssimo. Meu coração doía, tinha pena do pequeno, o que o deixava tão triste? Eu daria a ele qualquer coisa pra fazê-lo feliz! Levantei ele no colo, e ele abriu os olhos e respirou fundo, finalmente tinha se acalmado! Eu comecei a dizer coisas bobas a ele e elogiá-lo, dizendo como era lindo, gordo e como cheirava tão bem, ele sorria e babava mordendo sua pequena mão rechonchuda. De repente seus olhos começaram a brilhar e ele começou a chorar novamente; uma pequena chama brilhava e me assustou, quase derrubando-o. Eu tinha medo sim, mas meu amor por ele era maior e então comecei a cantar novamente e ele foi se acalmando até que dormiu.
Era meu filho, eu podia sentir isso, meu filho alien...
Acordei suada, tremendo, ainda cantarolando a canção mentalmente.


Quando desisti de falar com ele, ele resolveu aparecer. Ele trajava roupas diferentes agora, o traje branco tinha sido trocado por um preto, e me fazia lembrar de uniforme de piloto de formula um sem aquelas propagandas. Os cabelos estavam limpos e dividos com um coque no alto da cabeça e o resto solto nas costas. Suas botas eram as mesmas de sempre. Ele cheirava a limpeza e algo mais impossível de decifrar.
Ele continuava parado me olhando e eu comecei a me revoltar, ele me olhava como se eu fosse culpada por tudo... Como eu o odiava!
Notei também que sua espada também sumira, ele não precisava mais dela, afinal tinha ganhado a guerra.

Resolvi começar do começo. -Eu, eu...
-Fale duma vez!- Ele falou impaciente.
-Eu...- Eu estava pensando o que dizer, agora que o via parado na minha frente, parecia que todas as palavras tinha sumido.
-Sim, você!-Ele respondeu ríspido.
-O que vamos fazer? Não podemos...
-Sim, podemos e iremos!
-Seria melhor...-Tentei dizer.
-Os humanos nunca sabem o que é melhor pra eles! -Ele disse se aproximando de mim devagar, segurou meu queixo e me olhou diretamente nos olhos. Apesar do toque gentil eu podia sentir sua mão tremer, como se tentasse controlá-la para não me machucar.
-Nós obedecemos, não fugimos por razões egoístas! -Ele disse e me soltou virando as costas pra mim. Deu passadas longas até a porta, parou e virou novamente pra mim.
-Teremos duas celebrações e viveremos juntos, pelo bem de todos.-Ele enfatizou as últimas palavras.
Fiquei ali parada e zonza, sem saber o que fazer dalí pra frente.

Continua...


terça-feira, 17 de novembro de 2015

(Cap 08) Compatíveis!

Tentei me mexer na cama e o vão das minhas pernas doeu e repuxou, lembrei da perda do meu bebê e da limpeza que tiveram que fazer depois. Minha cabeça latejava e minha garganta doía ressecada demais. Abri os olhos e a luz da manhã os feria. Cambaleei até o pequeno banheiro e olhei no espelho piscando muitas vezes para os meus olhos se acostumarem.
Eu vestia uma camisola branca e mais nada, meus pés estavam descalços e a pedra do chão muito fria. Minha palidez estava de volta, eles tinham ótimos remédios para pele, nenhum sinal aparente de minha longa exposição ao sol.
Uma mesa surgira ao lado de minha cama e em cima dela o desjejum, leite, mingau de aveia e suco de laranja. Um copo com um liquido verde tambem estava sobre a mesa e ao lado um papel que dizia Beba! Na mesma hora senti o fluxo de sangue parar.Só liquido, eles queriam que eu pegasse leve. Parecia que queriam que eu me recuperasse.
Depois de tomar banho ajudada como sempre, me vestiram um lindo vestido de tecido leve, parecia seda mas não era, de um tom lindo de turquesa e com mini pedras douradas emoldurando o decote bonito, uma roupa linda e cara, feita para o calor do deserto, e eu fiquei imaginando a ocasião que eu precisaria de uma roupa assim...
Nos pés calçaram uma linda sandália da mesma cor do vestido e tentaram prender meu cabelo e eu protestei. Minha cabeça ainda doía e eu não aguentaria meus cabelos presos.
Fui levada pelo longo corredor, só que eu subi e subi ao invés de descer, até parar em um longo corredor com uma imensa porta no final, onde estava escrito em alto relevo: Alto comando. Escrito em português e em idioma Alien, algo impossível de decifrar, mas imaginei que era a mesma coisa nas duas línguas.
Quando a porta se abriu, fui conduzida até uma ampla mesa, que do outro lado já era ocupada por várias pessoas, homens e mulheres, todos ricamente vestidos, e em pé, ao lado, humanos comuns, e alguns chefes do antigo governo de meu pai.Sorri pra um velho conhecido, finalmente um rosto familiar. Mas tudo que ele fez foi acenar de volta. com um alívio visível no rosto, mas com medo talvez de se aproximar, afinal eu era uma propriedade do inimigo agora, não pertencia ao seu mundo.

Tudo começou a fazer sentido agora, parecia que eu iria saber o que fariam comigo, qual seria minha punição. Meu destino finalmente seria decidido.
Eles ficaram me olhando, era óbvio que eu estava diante do alto comando. Mas apenas um falou, o mais velho entre eles. Sua cabeleira era branca ao invés de castanha ou negra, como era o da maioria, e quando ele falou todos se silenciaram.
Sua roupa era branca e bordada e ele ficou de pé, deu a volta e parou na minha frente, pegou minhas mãos nas suas e me deixou em pé.
-Aqui está ela, a humana que trouxemos conosco quando atacamos o governador, ela foi trazida com um propósito...
-Ela foi sequestrada!-Gritou uma voz conhecida, o mesmo homem que me cumprimentou! Minha cabeça girou pelo esforço de ficar em pé e meu corpo vacilou, eu me sentei pra não cair.
O homem que segurava minhas mãos olhou para o homem que ousou interrompê-lo e duas chamas dançavam no lugar de seus olhos e o humano vacilou.
-Eu estava dizendo...-Continuou como se não tivesse sido interrompido- Ela é o caminho para a paz, através dela tudo vai mudar, a união de duas raças, ela se casará com um de nós para selar a paz, um mais valoroso entre todos nós...Ele me olhava e olhava em volta procurando alguém nas pessoas presentes.-Ela se casará com Niga! E todos exclamaram com espanto, homens e alienígenas.

Meu choque foi tamanho que eu não falei e esqueci de respirar, todos falavam ao mesmo tempo e toda a dor voltou como uma avalanche.
Quando parecia que nada pior podia acontecer aconteceu, eu estaria ligada pra sempre com o inimigo, nunca voltaria pra casa, nunca seria eu mesma novamente.
Tudo que fiz foi chorar, chorar e chorar.
O homem que interrompeu deu um passo a frente e  gritava feito louco no meio do vozerio.
-Ela vai cair, pelo amor de Deus, isso não é possível, façam alguma coisa...
Então todos se silenciaram quando Niga entrou no imenso salão. Ele trajava a roupa branca de sempre, a longa espada estava presa a cintura e o único adorno era algumas pedras preciosas presas nos seus cabelos trançados. Parecia que todos se arrumam para ter com o conselho. Tudo nele exalava autoridade, um "homem" a ser temido e obedecido.
Ele parou na frente do alto comandante e acenou levemente com a cabeça cumprimentando-o.
-Não falta mais ninguém, o casamento, como vocês chamam, de Niga e Susan, selará a paz...
Ele me olhou surpreso e olhou o alto comandante, ele também foi pego de surpresa, ao que parecia...
-Isso é impossível, como vamos saber se são "compatíveis"? O mesmo humano perguntou.
O alto comandante sorriu e chamou alguém do fundo do salão.
-Como muitas questões foram levantadas, saibam que pra medicina nada impede essa união, os corpos são muito parecidos, apenas algumas características nos diferenciam...
-Vocês estão falando do ato sexual?- Gritei a plenos pulmões. -Todos os olhares caíram sobre mim.
-Isso nunca acontecerá, porque antes eu prefiro morrer!- Cuspi as palavras.
Os humanos me olhavam orgulhosos de minha ousadia, o alto comandante me olhava como quem olha pra uma criança birrenta. Niga olhava pra mim com os olhos frios e a carranca tinha voltado ao seu rosto.
-Está decidido! Vamos selar a paz, com dois casamentos, um no ritual de vocês e outro no nosso pra não restar dúvida alguma...
-Eu acabei de perder uma criança, eu, eu...-Gritei!
-É claro, sabemos suas limitações físicas do momento, mas você é jovem e se recuperará. -Então olhou para o médico alienígena e um outro médico surgiu atrás dele, um humano sem dúvida.
-Quanto tempo para o casamento ser possível?- Ele perguntou aos médicos, um vacilante médico franzino, o humano, deu um passo a frente.
-Quarenta e cinco dias, talvez menos...- O outro médico, o alienígena discordou balançando a cabeça. -Trinta dias se tratada com nossos remédios.
-Perfeito! Está marcado então! Em trinta dias, a contar de hoje, será celebrado então.


Continua...

Vídeo novo amores, confiram!

domingo, 15 de novembro de 2015

(Cap 07) Tudo cor de rosa

Eu podia ver e ouvir mas não sentia nada! Minha vida continuou como sempre, eu era lavada, esfregada, penteada e vestida e também alimentada por elas mas, não sentia o gosto da comida ou a temperatura da água no banho. A noite, quando estava cansada de chorar, dormia de qualquer jeito. As noites eram terríveis, cheias de pesadelos, acordava aos berros, só pra ver que eu estava em um pesadelo maior.
Em um desses sonhos, eu acordava na minha casa, antes da guerra, e Diogo me olhava feliz com um lindo bebê cor de rosa no colo. De repente, seu rosto se transformou em uma caveira podre que tentava me devorar. Acordei suada e gritando e desisti de tentar dormir.

Eu não sabia o porquê de ainda ser prisioneira, a guerra estava acabada, com seus principais líderes humanos ridiculamente derrotados, eu não era mais útil, não precisavam de mim para negociar a paz, estava tudo terminado. As tropas alienígenas reconstruíam a cidade, outros líderes menores dos humanos se reuniam todos os dias na Torre do Alto Comando, estavam decidindo quem tomaria conta da cidade em nome deles, dos extraterrestres. Ao que parecia, queriam viver em paz, dividir a terra conosco. Aqueles que ousavam protestar eram sumariamente executados. Eles deixariam os humanos em paz desde que tivessem controle total do governo, os humanos participariam, é claro, mas apenas para ajudar, as decisões finais ficaria com o alto comando.
Parecia que tudo finalmente iria mudar pra melhor.
Eles já não escondiam as informações de mim, falavam tudo abertamente, como se quisessem que eu soubesse, ficasse informada de tudo.

Nada mais importava, eu ficava aonde me colocavam, certa vez me esqueceram no banho de sol, não sei quantas horas fiquei no sol escaldante, mas quando me buscaram, eu estava cheia de bolhas nos lábios e o rosto vermelho demais, mas o estranho é que eu não sentia arder. me levaram e me sedaram, podia sentir o anestésico mexendo com minha cabeça, a sala branca girava e a dor sumira, comecei a rir, seus rostos lindos estavam todos cor de rosa e tudo girava deliciosamente, girava, girava... Não de um modo ruim, mas delicioso, girando levemente.
Olhei pro meu próprio reflexo nas luzes enormes em cima de mim, era uma pessoa patética que me olhava de volta, magra e com o rosto vermelho do sol, os cabelos vermelhos emaranhados em volta de mim... Comecei a rir quando meus cabelos criaram vida e começaram a dançar em volta de mim.
Fiquei envolvida demais nessa loucura de girar e girar, rir até a barriga doer...

Numa dessas visões, meu sequestrador surgiu no meu campo de visão, tão calmo e sereno, sem a carranca costumeira, ele me olhava com curiosidade e talvez preocupação em seus lindos olhos, eu não senti medo, eu queria dizer que nada mais tinha importância, que estava tudo bem, mas tudo que eu fiz foi rir, rir histericamente, e quanto mais eu ria mais dava vontade de sorrir.
Não importava que eu era prisioneira, nessa noite eu estava tão feliz que eu podia dançar, podia sair pulando, beijando...
Ele me olhava e sua cabeça mudava de forma, primeiro rosa, depois pequena demais para seu corpo, depois grande demais como se o corpo não fosse sustentar seu peso.
Ele se aproximou e me olhava, eu olhava em volta e não havia ninguém por perto, onde estavam todos? A felicidade me deixava extasiada, sua boca tão linda... Não me lembrava de já ter notado uma boca humana tão linda e convidativa...parecia feita para o beijo, não um beijo fugaz, leve, mas um beijo de puro desejo, um prelúdio para algo maior e devastador...
Senti uma espiral de desejo começando a surgir dentro de mim, me enlouquecia e me tragava para as mais loucas sensações... Parecia que se eu não o beijasse toda a felicidade acabaria, todo meu destino ligado ao beijo daquela figura etérea, parecia um anjo da sedução... Não aguentaria mais um segundo sem beijá-lo, não me lembrava mais como beijar, quem beijava sempre era uma outra garota, numa outra vida... Quero tento sentir novamente a sensação que tudo que fiz foi abrir os braços e chamá-lo... Mas minha voz soou rouca e estranha aos meus ouvidos: -Venha, beije-me!- Por favor, beije-me... Meu anjo me olhava agora com estranheza e mesmo assim se aproximou e encostou seus lábios nos meus, um beijo suave e leve, mas ele se afastou rápido demais...Tentei segurá-lo mas suas mãos gentis me afastaram...-Diga seu nome...por favor...-Implorei. -Estou farta de não saber como chamá-lo...Diga-me...
Ele me olhou e vi um sorriso passar rapidamente por seu rosto, ou seria imaginação?
-Niga- Sua voz soou alta e clara.-Niga, esse é o meu nome Susan!- Sua voz foi sumindo e sumindo..
-Volte!-Eu queria gritar...
De repente tudo ficou escuro...

Continua...

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(Cap 06) Um pequeno pedaço de felicidade!

Na manhã seguinte fui levada em jejum até o hospital, localizado dois andares a baixo, fizeram muitos exames, clínicos e de sangue, na volta todos me olhavam, a maioria com desprezo, outros como se olhasse a paisagem. Eu sou a novidade aqui, desde que cheguei  estava longe dos olhares de todos, muitos me vêem pela primeira vez.É estranho como todos olham somente uma única vez e logo desviam o olhar.
Continuei andando com os olhares de todos e me senti extremamente constrangida. Andei aos tropeços, escoltada por duas de suas mulheres, de vez em quando elas me colocavam em pé e praticamente me carregaram de volta a minha cela.
Quando entrei na cela, meu desjejum me aguardava numa bandeja em cima da cama. Ataquei com vontade o leite, bebi tudo de uma vez, comi o pão esquisito em três dentadas. Deixei a maçã por último já que seria o único doce que receberia.
-Um pequeno pedaço de felicidade! -Repeti a frase que minha mãe sempre me dizia antes de me entregar um doce ou um chocolate.
Na minha pressa em comer nem reparei que o campo de força havia sido removido novamente e lá fora, na sacada, meu maior pesadelo me observava. E meu coração falhou uma batida.
Não sabia o que fazer, se continuava ali, ou se ia ao seu encontro. A verdade é que ele estava ali para me dizer algo, eu podia sentir, e qualquer assunto que fosse, não o deixava feliz. Sua postura exalava arrogância, e também uma raiva mal contida.
Como não fiz nada pra me aproximar e só fiquei olhando como uma idiota, ele se aproximou lentamente com os olhos fixos na parede de pedra atrás de mim, como se evitasse me olhar. Ele parou, coçou o queixo e me olhou diretamente pra mim.
-Seu marido e pai estão mortos, eles tentaram invadir a Fortaleza em um ataque estúpido e mal calculado.
Meu choque foi visível em meu rosto, porque ele estendeu a mão para me amparar antes que eu caísse, mas sua mão ficou suspensa no ar e eu não vi mais nada, quando acordei eu estava deitada na minha cama e um monte de gente estava com os olhos fixos em mim e se afastaram educadamente quando abri os olhos.
A dor que senti, da perda definitiva, me assolava e meu coração já partido, estilhaçou, chorei convulsivamente, nem me importei de estar rodeada por eles, dei vasão a minha dor, minha alma chorava...
Agora estava acabado, não havia mais ninguém a quem voltar, ninguém pra se lembrar do meu cativeiro, ninguém a quem chamar... Sozinha no mundo, rodeada por pessoas de outro mundo que me olhavam perplexos.
Fiquei de pé e me lembrei dos culpados por toda dor e sofrimento que eu estava sentindo, e lá estavam eles, na minha frente. Pulei no primeiro que vi e tentei estrangula-lo. Fui contida sem violência mas com firmeza, tentavam me colocar na cama e eu gritava e esperneava e chorava, tudo que consiguia dizer era a coisa que martelava na minha mente: -Assassinos! Assassinos! Então uma pontada no meu baixo ventre me fez parar, algumas mãos me levaram para o hospital e tudo que eu podia fazer era rezar.
-Senhor, poupe meu bebê, ele não, ele nãaaaaaaaoooooo! E então tudo escureceu, minha mente se refugiando na inconsciência!
 
Não sei quanto tempo se passou, eu sentia uma dor rasgar meu ventre e podia sentir o sangue saindo de dentro de mim, sabia que meu filho não existia mais, ele não teve o direito de nascer, sua vida interrompida brutalmente iria sempre me assombrar.
Eles iam e viam perto de mim, conversavam e de vez em quando me olhavam, eu observava como se fosse outra pessoa, telespectadora da minha própria vida. Anestesiada e imune a todos ao redor. Como se nada mais importasse, meu coração morreu ali, esvaiu junto com o sangue do meu  filho de dentro de mim! 
Continua...

sábado, 14 de novembro de 2015

(Cap 05) Cabelos vermelhos

Quando acordei alguns dias depois, levei um susto que meu coração quase saiu pela boca, meu sequestrador estava sentado no chão, de pernas cruzadas, em frente da minha cama e segurava uma mecha dos meus cabelos em sua mão e a examinava atentamente olhando pra cima contra a luz.
Fiquei parada, com o coração aos pulos sem saber se dizia algo ou se fazia alguma coisa pra mostrar que estava desperta. Mas imaginei que ele não gostaria de ser pego em flagrante, então fechei os olhos e tentei controlar minha respiração.
-Porque seus cabelos são vermelhos? -Ele me perguntou. E apesar do seu português soar perfeito, ainda assim tinha um leve sotaque que denunciava que ele não pertencia a esse lugar, extraterrestre, minha mente formulou a palavra sem eu nem pensar muito, quase automaticamente.
Abri os olhos e ele continuava na mesma posição, ele não se mexeu nem um centímetro, ele soube que eu havia acordado é claro.
Como eu hesitei, ele me olhou ainda segurando meus cabelos entre os dedos, agora com aparente impaciência. -E então? Ele perguntou.- Porque seu pai tem cabelos diferentes,,,
-Minha mãe tinha cabelos rui-vos, eu também. -Gaguejei a resposta.
Ele continuou a me encarar por alguns segundos que pareceram intermináveis, e eu pude reparar que sua barba sumira, o rosto era lindo e perfeito, sem nenhuma ruga ou cicatriz, o maxilar quadrado combinando perfeitamente com sua boca bonita, os olhos azuis rodeados por cílios espessos e negros como suas sobrancelhas e cabelos...a sua boca entortou numa careta que não combinava com seu lindo rosto, duas chamas surgiram ameaçadoramente no lugar de seus olhos,
Desviei o olhar com o coração aos saltos, não sabia o que fazer, senti o pânico me sufocando e me encolhi na parede como sempre fiz desde que cheguei aqui, Tinha medo de olhar de volta e encontrar sua espada em minha garganta ou algo pior.
Ouvi seus passos no corredor e só então me dei conta que meu medo não se tornaria real, pelo menos não ainda, talvez tivesse sido adiado.

Depois desse incidente peculiar não o vi por vários dias e me senti aliviada, minha caminhada foi feita pela manhã, comi, bebi, fui lavada e esfregada e não me importei nenhum pouco.
Tudo parecia melhor sem sua presença ameaçadora me cercando o tempo todo, 
Parece que minha relação com as mulheres esquisitas também melhorou, passamos de um ódio mútuo para uma fria cortesia.
Uma delas me olhava as vezes como se quisesse me dizer algo, então quando a olhava novamente parecia que eu tinha imaginado tudo, lá estava sua cara de sempre, superior e inatingível.

No deserto a noite, as vezes era possível ouvir algum som vindo da cidade, mas agora não se ouve nem um ruído, nada de tiros ou bombas no meio da noite. Tudo tranquilo desde que fui sequestrada.
As vezes me pego pensando se não sou uma vadia egoísta por só pensar no meu sofrimento e não me alegrar, porquê, afinal de contas, ouve uma trégua na guerra, nenhuma mãe vai perder seu filho, um pai pela manhã, não vai precisar ir reconhecer o corpo do filho.
Muita gente se sente mais feliz hoje, talvez eu devesse me alegrar também, afinal muitas vidas serão salvas. Mas tudo o que passa na minha cabeça é saudade, saudade do que tinha e do que talvez nunca mais consiga novamente: minha liberdade.

Escutei uma barulho alto que me  acordou no meio da noite, vinha da lateral do muro, nos andares superiores a minha cela, tinha certeza. Ajustei o roupão em volta do meu corpo e corri pra sacada. 
A torre do Alto Comando ardia em chamas em um dos lados, Dava  pra ver eles correndo pra lá e pra cá, era obvio que tinha sido um ataque e que eles não esperavam por isso.
Uma alegria perversa tomou conta de mim.
Meus vigias surgiram de repente e me levaram pra dentro e o campo de força surgiu novamente, eu estava restrita a cela.
Na manhã seguinte fiquei aguardando minhas "ajudantes" me darem banho e nada, tomei o banho e o desjejum sozinha, então chegou o almoço e mais tarde, ao anoitecer o jantar e ninguem me obrigou a comer ou beber.
Um pressentimento tomou conta de mim, alguma coisa estava acontecendo e eu adoraria saber o quê!

Continua...

(Cap 04) Penteado esquisito

Os dias que se seguiram depois da minha ida ao hospital foram cheios de coisas e acontecimentos estranhos. Para começar eu não ficava mais presa somente na minha cela, o campo de força foi removido e uma grande sacada surgiu. Agora estava liberada para que caminhasse por ali e tomasse sol.
Do incidente daquele dia, o hematoma estava esverdeado em volta e amarelo no meio, bem na lateral da minha cabeça, só dói quando é tocado, creio que logo sumirá.
As pessoas desse lugar levam suas obrigações a sério demais na minha opinião, depois da ordem de meu sequestrador eu fui lavada, escovada, secada e alimentada (na boca), por um batalhão de mulheres esquisitas.
Não havia como protestar, por mais força que eu fizesse, pra elas era como se eu fosse uma boneca, elas não faziam esforço algum para me obrigar. A única coisa em que me ouviram (porque berrei tanto que fiquei rouca), foi a recusa em prenderem meus cabelos em rabo de cavalo igual ao penteado esquisito que todos eles usam. Tanto faz se são homens ou mulheres, usam o tempo todo, ou as vezes soltam totalmente. Eu não quis prendê-los pelo simples fato do machucado na cabeça e também pelo penteado não me favorecer, pelo contrário.
Mas fiquei imaginando se não prenderam meu cabelo, não porque eu pedi, mas porque, talvez, eu não merecesse, como se usando esse penteado eu me tornasse uma deles, ou sei lá.
Estou em "negação", estresse pós -traumático ou sei lá o quê. Estou como uma casca vazia, já chorei tudo o que tinha pra chorar e por mais que meu coração esteja despedaçado e meus olhos queimarem, nenhuma lágrima, apenas o nó na garganta que continua aqui, entalado.
Para completar a esquisitice, um médico vem me ver duas vezes ao dia, não me diz nada e me toca o menos possível.
Ouço notícias da guerra aos pedaços, é claro que não me dizem nada, mas parece que ambos os lados deram uma trégua desde meu sequestro, ambos os lados aguardam o desenrolar dos acontecimentos,
Parece que meu sequestrador acertou na jogada, sua tática funcionou, fico imaginando por quanto tempo ainda funcionará.

O motivo por eu ainda chamá-lo de sequestrador é simplesmente por não saber seu nome. Embora, eu tenho certeza, eles sabem o meu, não que eles se importem em me chamar por Susan, aqui ninguém conversa comigo, a não ser ordens, tipo: -Coma isso, beba esse remédio, ou críticas tipo: -Seu cabelo está sujo, deve ser lavado mais uma vez, -(sim, elas me dão banho).
Embora eu ainda seja vigiada dia e noite, não me importo tanto como antes, meu sequestrador assustador está sempre por perto, me olhando com aqueles olhos medonhos, com a mesma carranca de antes. Sempre por perto, como uma sombra.
Mas o medo surreal que eu estava sentindo passou, talvez eu esteja desenvolvendo síndrome de Estocolmo, claro que ainda tenho medo, mas agora com alimentação várias vezes ao dia e sono tranquilo a noite, durmo como pedra e não resta muito tempo pra pensar nas coisas.
Ele não vai me matar, nem ao meu bebê, pelo mesmo por enquanto. E por mais que ele queira isso, creio que ele deve ter um ótimo motivo para me manter respirando.
E algo me diz que quando ele se alegrar eu terei muitos motivos para entrar em pânico!

Continua...

Inspiração de unhas para o Verão!





Vídeo fresquinho gente, confiram!